FALARES AFRICANOS

A INFLUÊNCIA DA LÍNGUA AFRICANA NO BRASIL É BASE DE "BRASILIDADES"

FALARES AFRICANOS

É IMPORTANTE O RESGATE E A VALORIZAÇÃO DA AFRICANIZAÇÃO DO PORTUGUÊS DO BRASIL

FALARES AFRICANOS

A MEMÓRIA SÓCIOHISTÓRICA É MANTIDA E REVERENCIADA PELA ORALIDADE

FALARES AFRICANOS

COMUNIDADES TRADICIONAIS AFIRMAM O MULTICULTURALISMO E OS DIREITOS À DIFERENÇA

FALARES AFRICANOS

POLÍTICAS AFIRMATIVAS E DE REPARAÇÃO SÃO NECESSÁRIAS PARA EQUIDADE E IGUALDADE DE DIREITOS

domingo, 1 de março de 2020

Carnaval Carioca 2020 que Tiro foi esse?

Sem ter a intenção de plagiar a nossa querida cantora Jojo Todinho. Peço licença para pegar carona nessa expressão que balançou o Rio de Janeiro, “que tiro foi esse”! Foi exatamente isso o que aconteceu na Marquês de Sapucaí. Um “tiroteio” a céu aberto que atingiu milhares de pessoas de uma só vez. Cada uma reagindo à sua maneira, é claro, ao recado que foi entregue pelas agremiações que desfilaram. Um dos tiros de maior barulho, ficou por conta das “mulheres negras” da Viradouro de Niterói, a grande campeã deste ano. Elas investiram toda sua formosura, bravura e ancestralidade para “lavar a alma” de todos os que estavam com um grito de insatisfação na garganta. Conseguiram, “lavaram nossa alma” com as águas de Oxum!
O ano de 2019, ano de preparação do carnaval 2020, foi marcado por diversas indignações, principalmente das classes populares e periferias, que historicamente tem seus direitos violados e banalizados, com muita frequência. Mais a população não ficou passiva em “seu berço esplêndido”. Em meio as turbulências, grupos foram se unindo para causar fatos políticos que pudessem demonstrar suas insatisfações mais profundas com a condução das políticas públicas direcionadas ao povo. Destaco aqui dois “fatos políticos” de relevância ocorridos em 2019: • O primeiro é o Manifesto Diversidade Carioca criado pela Frente Favela e Alternativa Popular. Amplamente divulgado na mídia e nas redes sociais,o documento criou força e está ganhando cada vez mais assinaturas. Entre os que já assinaram estão: Sandra de Sá, Léa Garcia, Jennifer Nascimento, Elisa Lucinda, Kleber Lucas, Martinho da Vila e Haroldo Costa.
• O segundo são os samba enredos do carnaval 2020. Criados e escolhidos pelas agremiações, inseridas nas comunidades de base do Rio de Janeiro. Ambos, conseguiram resgatar e afirmar a importância da participação popular no jogo político. Juntaram diferentes gerações, como jovens e veteranos, em torno de uma luta. Focaram o respeito mútuo à diversidade e às identidades. Reuniram artistas, personalidades, mestres, doutores, intelectuais, analfabetos, trabalhadores informais e formais, seres humanos de diferentes cores, etnia, religião e gênero, em um só grupamento reivindicando direitos, respeito, justiça e paz. Meu pai costuma dizer que “quem não sabe ler, observa desenhos”. Nesse sentido eu ouso afirmar, que o manifesto escreveu e os samba enredos desenharam para quem ainda não conseguiu entender a extrema urgência de transformação do cenário carioca. Fazendo bom uso de seus corpos políticos no sambódromo.
Um TIRO certeiro nos governantes, quanto ao tratamento desumano direcionado aos pobres, favelados, indígenas, negros, adeptos das religiões de matriz africanas, mulheres e as pessoas de livre orientação sexual. É obrigatório pensar sobre a sociedade que precisamos transformar. Pensar sobre o que é realmente cuidado? Deixo aqui uma pequena parte da valiosa lição que aprendemos na avenida Marquês de Sapucaí, para que tenhamos fòlego para transformar a realidade que está colocada.
"O Rio de Janeiro é uma cidade, hoje, dividida. Partida. Polarizada. Quebrada. Em seu leito “esplêndido” navegam castas privilegiadas, elites conservadoras que mantém um modelo excludente, ganancioso, de concentração de renda, aumentando, cada vez mais as desigualdades e não permitindo ao povo, o acesso às riquezas que ele ajuda a construir". (Manifesto Diversidade Carioca) Podemos e devemos mudar o jogo. A força para isso, foi mostrada na avenida e não estamos sozinhos!

terça-feira, 12 de setembro de 2017

Terreiros depredados e candomblecistas agredidos em Nova Iguaçu. O que há por traz disso?

No dia vinte e nove de agosto, estive na reisidência da D.Maria da Conceição, a idosa agredida com uma pedra, vítima de intolerância religiosa em Nova Iguaçu, Bairro Cerâmica. A conversa com ela me deixou estarrecida. Ela relatou as reiteradas vezes em que vinha sendo xingada de feiticeira, bruxa dos infernos, macumbeira safada, entre outros. Até o dia em que reagiu verbalmente e o resultado foi ser apedrejada. Ela e o seu nucleo familiar estão referenciados ao CREAS de abrangência de seu bairro, para acompanhamento. Ela está recuperando-se rápido dos ferimentos do corpo, mais ainda há muito trabalho pela frente, para que ela se recupere dos ferimentos da alma!
Neste feriado, sete de setembro, estive em um dos 7 terreiros de candomblé do Parque Flora, mais conhecido como “Buraco do Boi”, em Miguel Couto Nova Iguaçu. Que foi depredado na madrugada. Encontramos ali aproximadamente quarenta pessoas. Elas estavam todas organizando o que restou da depredação e retirando do terreiro. Enquanto outros limpavam e descartavam tudo o que foi quebrado. Haviam aproximadamente cinco carros que se revezavam na entrada da casa. Os carros eram abastecidos com os utensílios que não foram quebrados e em seguida partiam para um terreiro de outro pai de santo amigo que se prontificou a guardar os utensílios sagrados em seu barracão. Era um movimento de muita solidariedade e união. Disse a família de Axé que nos recebeu, que estávamos ali a pedido do Secretário de Assistência Social para um acolhimento das vítimas e uma articulação para posteriormente sentarmos com governo municipal, em um encontro a ser articulado pelo secretário. Fomos bem recebidos, mais com ponderações! Havia um nível de cobrança com a posição e as providências do prefeito em relação ao ocorrido.
Encontramos dentro do terreiro um cenário completamente caótico e devastador. Haviam oito pais e mães de santo de outros terreiros dando apoio ao Pai de Santo da Casa. Este, depois de muito tempo, conseguiu falar rapidamente conosco, dada sua revolta e tristeza diante do ocorrido. Ele se recusou a dar entrevista, não permitiu que fotografássemos nada e pediu para que o seu nome não fosse mencionado. Ficou claro, o risco de uma retaliação por parte dos criminosos. Tivemos a oportunidade de ouvir outros pais, maes, filhos e filhas de santo para melhor compreensão do ocorrido. As narrativas relatam que estes ataques aos terreiros partem de uma facção criminosa que se auto intitulam “traficantes de Cristo”. Esta facção estaria agindo em Nova Iguaçu, mais especificamente nos bairros de bendez, cotó e buraco do boi, todos em Miguel Couto, com o principal objetivo de impedir que as religiões de matrizes africanas realizem seus preceitos. Nos chamou atenção o relato de como as vítimas são abordadas, agredidas, intimidadas e ridicularizadas no momento em que são invadidas em seus terreiros. Os bandidos chegaram a fazer com que uma mãe de santo engolisse o seu fio de conta e a outra que estava com dois Yaos recolhidos, infartou na hora e está internada. Estavam todos muito chorosos e abalados, indignados e temerosos por seus terreiros. O cenário é preocupante.
Não tenho como descrever o meu sentimento ao ver os utensílios quebrados, de Exu a Oxalá, sem exceção. Demorei a vir aqui escrever porque a cena me afugentou as palavras. Mais consegui recuperá-las finalmente.
Percebi que muitas pessoas como eu, estão se perguntando: O que há por tráz disso? Então eu não poderia escrever este texto sem fazer esta ponderação. Pelo menos quatro aspectos sociais colaboram para esse ocorrido:
A implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) de 2008 a 2014, infelizmente não cumpriu o seu papel central para a segurança pública e o desenvolvimento social e econômico das comunidades. Foram 38 UPPs nas principais comunidades do município do Rio de Janeiro que afugentaram os traficantes para as áreas não dominadas pelo tráfico e de extrema vulnerabilidade social. Nova Iguaçu é um dos municípios da baixada que recebeu este “maldito” legado das UPPs no Rio. A cidade pasou a ter outra configuração, de crescente dominação do tráfico, com traficantes de “importação”.
Um projeto político de poder, “Jesuscracia”, vem sendo executado com força total desde a década de 80, com objetivo de destituir o Estado Laico. O crescente empoderamento de pastores e líderanças evangélicas nos parlamentos municipais, estaduais e federais e também no executivo, passibilita que muito dinheiro seja colocado nas igrejas e em ações sociais desenvolvidas por elas. Para além disso, ela expandiu seu campo de atuação em presídios e projetos de recuperação de usuários de drogas. Altos investimentos tem sido feito na música e na moda gospel, criando uma “estética gospel” que carrega a ideologia Jesuscrata. Chegando a parecer que “não ser de Jesus é um absurdo, não segui-lo é uma infâmia, afinal o Brasil é de Jesus”. No bairro de Miguel Couto em Nova Iguaçu, em 2014, foi erguido um monumento a bíblia no lugar onde há cinco terreiros diferentes nas proximidades.
A ideologia de “Exército de Cristo”, vem sendo disseminada com força total, prioritariamente entre os jovens. Um fato significativo é a campanha agressiva do movimento Neo-Pentescostal, ocasionando uma importância decrescente dos cultos Afro Brasileiros. O movimento Neo-Pentecostal oferece uma alternativa ao quebrar as ligações do indivíduo com o passado. Transfere a responsabilidade dos atos pessoais do eu para as entidades espirituais e proporciona proteção contra o “demônio espiritual, o causador”. Isto facilitou sua penetração em comunidades dominadas pelo tráfico e acirrou a perseguição às religiões de matrizes africanas, historicamente demonizadas, por outras religiões. A pessoa passa a lutar contra o “mal”, em nome de Cristo. A morte é aceita, entretanto, sempre que necessário para defender sua gangue, seu Deus ou suas próprias vidas. Este fenômeno acontecendo em um lugar onde existe “Quase” uma igreja em cada esquina, só potencializa o fortalecimento das ações criminosas. Uma escola de samba teve suas atividades impedidas, porque o presidente se converteu e transformou a escola em igreja. E no ano de 2016 o famoso carnaval de Nova Iguaçu não aconteceu. Foram cifras milionárias para comemoração do natal na cidade e zero investimento para o carnaval.
Outro fator de importância é o racismo. O censo de 2010 do IBGE divulgou que 64% da pululação de Nova Iguaçu não é branca, são auto declaradas amarelas, indígenas, preta e pardas. No mapeamento da políticas para superação do racismo e outras formas de discriminação, não se localiza muita coisa que tenha tido impacto positivo. A cidade historicamente conhecida como cidade “dormitório” e governada por regime “coronelista”, ainda não avançou muito. O racismo ainda é um problema a ser superado, que influencia diretamente nos olhares preconceituosos voltados para religiões de matrizes africanas. Ainda falando de Miguel Couto, existe um sub-bairro chamado Vila Olorum. Seus moradores contam a história de que a região era uma fazenda, nesta fazenda o proprietário conheceu a umbanda através dos negros e tornou-se um umbandista. A geração futura de sua família precisou lotear a fazenda e vender os lotes. Dessa forma cada rua ganhou o nome de um Orixá. Desde 2010 os nomes das ruas vem sendo modificados gradativamente. A rua Oxum passou a ser chamada de rua Nossa senhora da Conceição. Fato este que deixa claro a discriminação com a “religião dos pretos”. A famosa rua treze de maio também teve o seu nome trocado. Até hoje os moradores ainda mencionam como ponto de referência a “antiga rua treze de maio”, e a grande maioria nem sabe o nome atual da rua.
A cidade de Nova Iguaçu precisa de uma ação de segurança pública que impeça ações criminosas de facções religiosas. Não podem ser banalizadas ocorrências. Também é necessário que a cidade volte a trilhar o caminho da superação das desigualdades, do preconceito e das discriminações. Precisa ressurgir com força, movimentos sociais e políticos que contraponha os “mal feitos” políticos, restabelecendo os princípios do Direito Humano e da democracia. A escola precisa ser um lugar que prepara nossas crianças para não aderirem a cultura do ódio e do racismo. Os projetos sociais precisam contemplar igualmente os terreiros que guardam a riqueza da cultura africana, na culinária, na moda, na dança e no legado linguístico. Essa cultura precisa ser compreendida pela sociedade. Diversas ações de resgate de patrimônio imaterial da cidade, precisam ser implementadas, além do resgate sócio histórico das referências de identidade do povo iguaçuano. Por fim, na bíblia crista, Jesus condenou o apedrejamento, chegou a impedir que uma prostituta fosse apedrejada. Nessa mesma biblia ele ensina que “a obra do diabo é matar, roubar e destruir”. O questionamento sábio de um de nossos heróis negros diz “Nossa religião nunca queimou ninguém na fogueira e no entanto ela é que mantém a fama de servir ao diabo”. (Abdias Nascimento) Matar, roubar, apedrejar e destruir não é o que historicamente as religiões de matrizes africanas fazem. Este processo de demonização precisa ser desconstruído para evitar uma guerra fundamentalista.

domingo, 3 de setembro de 2017

Exu Rei e os nossos Heróis Negros!

“Ofereço-te Exu o ebó das minhas palavras neste padê que te consagra não eu porém os meus e teus irmãos e irmãs”. (Exu Rei – Abdias Nascimento) Ontem eu tive a satisfação de assitir no Odeon um documentário e dois curtas que homenageiam três de nossos heróis brasileiros. A exibição dos filmes, fez parte da programação do Encontro de Cinema Negro Zózimo Bulbul, que acontece há dez anos. Na sequência: o curta Memórias Para um Guerreiro - Zózimo Bulbul, o documentário Exu Rei - Abdias Nascimento e o curta Eu Preciso Destas Palavras Escritas - Bispo do Rosário. O teatro estava praticamente lotado e o público aplaudiu com veemência a cada etapa de exibição dos filmes. O início da exibição ao som dos atabaques reverenciando Exu, Orixá do candondomblé, foi absolutamente emocionante. Exu Rei. Ele realmente reina durante todo documentário, e com maestria. No candomblé, Exú é “A boca do mundo”, sem ele não existe comunicação com o mundo espiritual. Ele é considerado o mais “humano dos Orixás”, que caminha na terra entre os humanos, abrindo caminho e distribuindo proteção. Exú é sempre o primeiro a receber as oferendas, as cantigas, as rezas, é saudado antes de todos os orixás, antes de qualquer cerimônia ou evento. O documentário estabelece uma relação dos três heróis negros como Exus. Homens que caminharam entre nós com a missão de abrir caminhos, esclarecer, criar alternativas para superação das opressões políticas deste mundo, dar visibilidade aos preconceitos camuflados, exigir o respeito ao direito humano. E tudo isso através da arte, da cultura, do cinema, da literatura e da política. Homens que abriram “a boca para o mundo”. Nesse contexto, a expressão Exu Rei, foi muito bem conferida a eles. O curta conta com a participação da Yalorixá Mãe Meninazinha da Oxum, uma das mais influentes Yalorixá do Brasil, que dirige um terreiro de 105 anos em São João de Metiri, Ilê Omolu e Oxum. Sua participação foi de fundamental importância para esclarecimento e desconstrução do crescente processo de demonização das religiões de matrizes africanas no Brasil. Ela fala sobre Exu no candomblé e no sincretismo religioso. E fala sobre Abdias do Nascimento. Um ponto alto, foi ver a quantidade enorme de negros, negras, e não negro(a)s, alto afirmados com seus turbantes, black power, birotes, tranças, eketé, lenços e tecidos africanos, adereços e jóias africanas, sapatos, roupas, bolsas e encharpes coloridos, revelaram a crescente adesão ao estilo afro étnico pop, como forma de expressão da não subordinação aos modelos sociais de beleza impostos pela mídia. Os tempos não são fáceis! O público majoritariamente jovem, estava sedento de referenciais heróicos para fortalecerem seus sentimentos de resistência aos rumos de corrupção, violência, violação de direitos, desmonte das políticas inclusivas e devastação que o país está trilhando. E neste sentido, relembrar nossos heróis negros e suas trajetórias de sucesso, foi providencial. Eu poderia dizer muito mais coisas. Mais não conseguiria trazer a emoção sentida diante da tela. Paro por aqui. E deixo, para acrescentar nosso conhecimento e orgulho, uma mini biografia de nossos Exu Reis que nos inspiram a continuar a luta! Vale muito a pena assistir os documentários. Zózimo Bulbull nome artístico de Jorge da Silva, estreou no cinema no início dos anos 1960, no filme Cinco vezes Favela. E no final dos anos 60, tornou-se o primeiro negro a ser protagonista de uma novela brasileira, ao participar da novela Vidas em Conflito, na extinta TV Excelsior, fazendo par romântico com Leila Diniz. Zózimo é um dos ícones negros dos anos 1960 pelos trabalhos na televisão e no cinema. Foi um ator, cineasta, produtor e roteirista. Atuou em 30 filmes, tendo dirigido em torno de 10 filmes. Ganhou em torno de 20 prêmios nacionais e internacionais. Atuou em filmes importantes na história do cinema brasileiro. Trabalhou com diretores de renome como Glauber Rocha, Cacá Diegues, dentre outros. Como diretor realizou trabalhos focados nas questões pertinentes à população negra. Insatisfeito com a condição reservada aos negros nas telas decidiu escrever e dirigir seus próprios filmes. Em 1974, dirige o curta metragem em preto e branco “Alma no Olho”, considerado uma das melhores obras da cinematografia afro descendente. Em 1988 lança o seu longa metragem “Abolição”, que propõe uma reflexão crítica sobre a então comemoração dos 100 anos da abolição da escravatura. Dirigiu também inúmeros curtas, sempre com um olhar para o negro na sociedade brasileira: “Aniceto do Império” (1981), “Samba no Trem” (2000), “Pequena África” (2002), entre outros. Em 2007, fundou o Centro Afro Carioca de Cinema, aonde vem desenvolvendo um trabalho de referencia para a Cinematografia Afro Brasileira. Um trabalho de conscientização, memória e incentivo a novos caminhos, de aumento de autoestima e da compreensão do mundo através da arte Cinematográfica, onde são realizadas Oficinas, debates, seminários, mostra de filmes nacionais e internacionais, lançamentos de livros entre outras ações. Nascimento: 21 de setembro de 1937, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro Falecimento: 24 de janeiro de 2013, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro Abdias Nascimento foi militar, político, ativista dos direitos civis e humanos das populações negras, ator, artista plástico, escritor, dramaturgo e professor universitário. Entrou para o exército brasileiro e em 1936 Abdias se integrou ao movimento da Frente Negra Brasileira, que realizava protestos em locais públicos e trabalhava na perspectiva de integrar o negro brasileiro na sociedade de classes. Entrou em conflito. Combatiam em locais como hotéis, restaurantes e bares que impediam a entrada de negros. Nessa época, Abdias fez inclusive parte da comitiva que foi ao Rio de Janeiro protestar junto ao presidente Getúlio Vargas. O que fez com que ele se desliga-se definitivamente do Serviço Militar. Ao sair do exército, passou a ser ferozmente perseguido pela polícia de São Paulo em razão de sua atuação na FNB. Resolveu então partir para o Rio de Janeiro, onde morou inicialmente no morro da Mangueira e conseguiu trabalhar como o revisor do jornal O Radical. Considerado um dos maiores expoentes da cultura negra no Brasil e no mundo, fundou entidades pioneiras como o Teatro Experimental do Negro (TEN), o Museu da Arte Negra (MAN) e o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO). Foi um idealizador do Memorial Zumbi e do Movimento Negro Unificado (MNU) e atuou em movimentos nacionais e internacionais como a Frente Negra Brasileira, a Negritude e o Pan-Africanismo. Há muito o que dizer sobre a trajetória de abdias. O período no qual o teatrólogo brasileiro ficou em exílio foi muito fértil intelectualmente para o pan-africanismo, movimento intelectual que propunha a união e unidade política entre as nações africanas e as culturas decorrentes da diáspora deste continente. Grandes pensadores debatiam as perspectivas da questão racial em escala atlântica, espelhados pelas Américas, África e Europa, alguns deles empenhados na ideia de uma África Ocidental socialista, influenciados que estavam pelas teorias marxistas. Abdias ficaria fortemente entusiasmado com uma das vertentes do pan-africanismo, aquela de ideologia mais nacionalista, representada nas figuras de Steve Biko (África do Sul), Patrice Lumumba (República Democrática do Congo), Aime Césaire (Martinica) e Malcolm X (Estados Unidos). Com esse espírito, participou da Conferência Pan-Africana Preparatória realizada em Kingston, Jamaica, em 1973, que abriu os trabalhos para o 6º Congresso Pan-Africano, realizado no ano seguinte na Tanzânia, em Dar-es-Salam. Entre 1976 e 1977, Abdias residiu na Nigéria, onde atuou como professor visitante na Universidade de Ifé. O exílio de Abdias terminou em 1981. Ano em que criou em São Paulo o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro), com a ajuda de Dom Paulo Evaristo Arns. Nascimento 14 de março de 1914 Franca, São Paulo Falecimento: 23 de maio de 2011, Rio de Janeiro Arthur Bispo do Rosário foi um artista plástico brasileiro, dado como louco, depois de ter sido boxeador e oficial da marinha. Como boxeador ele nunca foi nocauteado, chegando a ser conhecido como “lobo do mar”. Como oficial da marinha, foi desligado em 1933 por indisciplina, considerando sua inconformidade diante do preconceito! Em dezembro de 1938, foi dado como louco e encaminhado ao Hospital Nacional dos Alienados e depois transferido para Colônia Juliano Moreira. Seu laudo, resgatado pela escritora Flávia Corpas e Frederico Morais, no livro “Arte Além do Tempo”, surpreende pela descrição de um detalhe que chama atenção. Arthur Bispo do Rosário, é descrito como “calmo, de olhar vivo”, com “ares de importância” e “fisionomia alegre”, o paciente também podia associar “idéias com extravagância”. Esse laudo mais parece uma mini biografia que destaca as qualidades do artista. E não de um homem adoecido mentalmente. Mais foi com este laudo que o artista permaneceu internado durante anos no hospício, onde ele produziu quase toda sua obra internado. Direcionou sua obra ao debate sobre o pensamento eugênico, o preconceito e os limites entre a insanidade e a arte no Brasil. Nos estandartes e mantos que bordou, ele relaciona diversas palavras às experiências que passou. As centenas de nomes escritos em ordem alfabética e os objetos agrupados por proximidade, revelam que ele não vivia em delírios, ele sabia o que estava fazendo. Em 1980, é denunciado o estado de imensa precariedade em que se encontrava a assistência psiquiátrica no Brasil. O jornalista Samuel Wainer Filho realiza uma matéria sobre a Colônia Juliano Moreira para o programa Fantástico, da TV Globo, no qual Bispo do Rosário e seus trabalhos aparecem. Desde então, seus trabalhos ganharam visibilidade, respeito e notoriedade. Chegando a ser maior destaque na bienal de São Paulo, Museu Vistoria & Albert, em Londres, e na Bienal de Veneza, a maior mostra de arte contemporânea do mundo. Nascimento: 1909, Japaratuba, Sergipe Falecimento: 1989, Jacarepaguá, Rio de Janeiro

quinta-feira, 19 de março de 2015

"Eu verso buakamukua" Um resgate dos diferentes falares africanos no Brasil!

No mês em que o Rio de Janeiro comemora seus 450 anos (março de 2015), e ainda ás vésperas do Dia Internacional de combate à discriminação racial (21 de março), a Livraria da Travessa, Editora All Print e autora Dayse Marcello, lançaram livro “Eu verso buakamukua” no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro.
Inaugurado em 12 de outubro de 1989, O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) Rio de Janeiro transformou-se rapidamente em um dos centros culturais mais importantes do País. É o museu/centro cultural mais visitado do Brasil e o 17º no mundo, de acordo com o ranking da publicação inglesa The Art Newspaper (abril/2013).  É uma rede de espaços culturais geridas e mantidas pelo Banco do Brasil, com o objetivo de disseminar a cultura pela população, atualmente, encontra-se instalado em quatro capitais brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília.
A tarde de autógrafos no CCBB, realizada no dia 18 de março, reafirmou para sociedade carioca a necessidade do entendimento do Brasil em sua pluralidade. Também chama atenção para necessidade da utilização do espaço cultural enquanto veículo de preservação e divulgação da memória sócio histórica do desenvolvimento do Brasil e a inegável contribuição dos povos africanos.
Diversos leitores de diferentes perfis, tiveram a oportunidade de conversar com autora e conhecer a obra.  Professores, publicitários, jornalistas, radialistas, estudantes, gestores, critícos literários, imigrantes, entre outros, adquiriram o livro e registraram comentários e críticas muito positivas da obra.
A palavra buakamukua significa diferente. O livro “Eu verso buakamukua” é uma singela contribuição à implementação da Lei 10.639 nas Escolas. Ele destaca questões de gênero, da existência, além de destacar a contribuição do povo negro na constituição do vocabulário da língua brasileira. Palavras africanas abrasileiradas e /ou incorporadas em nosso vocabulário. Como disse Lélia Gonçalez: No Brasil não falamos o português, falamos o "Pretuguês"!
A ideia central do livro é mostrar ao leitor, através da linguagem versada, o quanto de “africano” falamos todos os dias no português brasileiro. É muito fácil identificarmos, por exemplo, palavras do idioma inglês presentes em nosso vocabulário, mais não é nada fácil identificarmos as palavras de origem africanas. A proporção de que o conhecimento da herança linguística africana chega ao leitor isso faz com que surja um fortalecimento da identidade étnica e social, além da preservação da memória e história dos povos africanos trazidos como escravos para o Brasil.
Muitas literaturas tem sido escritas com estes objetivos, mais poucas são as que ousaram falar especificamente disso através de versos e poemas. Neste sentido o livro tem sido muito bem aceito e recomendado por leitores.
O leitor lê o poema e quando vira página descobre que as palavras destacadas no poema são de origem africana, bem como a região da África que ela está referenciada e seu significado que a levou a ser incorporada em nosso vocabulário.
A chegada do livro ás Livrarias da Travessa é a culminância de uma significativa tragetória do livro em espaços culturais, sociais e educacionais, durante um ano.  De março de 2014 a março de 2015. Vale a pena conferir!
O livro custa R$ 20,00 e já se encontra disponível para compra nas lojas das Livrarias da Travessa.

Lançamentos
O livro foi lançado pela primeira vez no Teatro da Casa de Cultura de Nova Iguaçu no dia 13 de março de 2014 com um público de formadores de opinião, amigo(a)s e gestore(a)s. é importante destacar a presença da Secretaria Municipal de Assistência Social, e dos representantes do Secretário de Cultura e da Secretária de Educação. 

No dia 28 de março, realizamos o segundo lançamento na Cidade de Nilópolis dentro de uma Escola Municipal com um público pra lá de bom. Alunos, pais, professores, Gestores (destacando a Coordenadora de Políticas de Igualdade Racial e o Secretário de Educação).
Uma meta estabelecida para o livro foi a realização de uma jornada, prioritariamente pela baixada fluminense e interior do Estado, divulgando o livro e conquistando diferentes leitores. O que tem ficado claro nestas centenas de livros vendidos, é que a rede escolar tem gostado do material e alguns municípios já estão em processo de compra para rede escolar. Professores, em sua maioria, tem indicado o livro para leitura, e isso tem sido muito positivo!



Programa de televisão




O PROGRAMA ORI NA TV COMUNITÁRIA/RIO (CANAL 6 DA NET)

Tem como objetivos valorizar a Cultura e a Religiosidade Afro, trazendo esclarecimentos pautados nas Tradições e em pesquisas fundamentadas. Neste contexto a escritora foi entrevistada no programa que foi ao ar no dia 05 de maio de 2014. 
Programa de rádio


RÁDIO METROPOLITANA AM 1090(RJ) RÁDIO BANDEIRANTES AM 1360 (RJ)
No dia 17 de junho de 2014, autora foi entrevistada ao vivo no programa de rádio MELODIAS DE TERREIRO. Reprisado três vezes na semana, durante quinze dias.






Bienal Internacional do livro em São Paulo



No dia 26 de agosto de 2014 o livro foi lançado na Bienal Internacional. O lançamento foi um verdadeiro sucesso que resultou na aquisição do livro por várias Escolas Públicas de São Paulo.






















IV Colóquio Cultural da Baixada Fluminense: Cultura, identidade e manifestações artísticas afro-brasileiras.

No dia 16 de setembro de 2014 autora foi convidada e participou do IV Colóquio Cultural, realizado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia. Rio de Janeiro, Campus Nilópolis. A exposição sobre o livro e a troca com outros autores e mestres da academia produziu críticas literárias muito positivas. O evento aconteceu na Casa de Cultura de Nova Iguaçu.

 I Seminário Internacional Fela Kuti da UERJ
No dia 14 de outubro de 2014 autora foi convidada a participar do I Seminário Internacional da UERJ que homenageou FELA KUTI, tendo como foco “A educação, os movimentos sociais e a África que incomoda”, realizado na Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ, Campus Maracanã. Autora realizou uma oficina com tema do Projeto “Inventário dos falares africanos no Brasil” e na ocasião o livro subsidiou a discussão como modelo de produção possível no resgate linguístico dos diferentes falares africanos no Brasil.

Seminário Mulheres Negras, Arte e Cultura na Baixada Fluminense: Vozes, Olhares e Práticas
No dia 21 de outubro de 2014 autora foi convidada a participar a mesa expositora do Seminário Mulheres Negras que foi realizado no auditório do IFRJ. A partilha da experiência de produção do livro com os alunos universitários foi um sucesso.



2º Festival Leitura Interativa Mesquitense – FILM
Autora foi convidada a lançar o livro no FLIM. O lançamento aconteceu no dia 08 de novembro de 2014, na Vila Olímpica, Café Literário, município de mesquita. A FLIM bem como o lançamento do livro, foram sucessos absoluto.

Caldo de Cultura
No dia 14 de novembro de 2014 a equipe de produção do Sarau Caldo de Cultura, em homenagem a Consciência Negra, convidou autora participar com entrevista exclusiva sobre o livro. O Caldo de Cultura é uma importante atividade que aglutina os principais artistas, alunos, professores e cidadãos na Praça da Telemar em Mesquita. Está na sua 9ª edição e já é um sucesso.  

Sarau Kizomba Poética
No dia 18 de novembro de 2014 autora realizou com a poeta Roberta Miranda uma performance poética no Sarau Kizomba. Os realizadores do evento homenagearam autora com Fanzine divulgando as poesias do livro buakamukua.


Evento: “A importância da cultura negra e a real contribuição dela para a construção de nosso país”.
No dia 19 de Novembro de 2014 autora realizou uma palestra na Escola das Artes Técnicas Paulo Falcão – EAT (FAETEC), com foco na produção do livro e na importância do resgate dos falares africanos no Brasil.


 Sarau de ideais no Quiosque da Rede Globo
O dia 20 de novembro de 2014 foi comemorado com estilo pela autora divulgando o livro no Sarau de Ideias da Rede Globo em Copacabana, RJ, a convite do Sarau Mulheres de Pedra. Centenas de pessoas aglutinadas no quiosque tiveram a possibilidade conhecer um pouco da contribuição linguística dos povos africanos no Brasil. 




 Festival Literário Internacional da Diáspora Africana de São João de Meriti
Autora participou da Trilha da Diáspora Africana (TD): Destinada a estudiosos da academia ou a pessoas que produzem o saber popular sobre os movimentos e registros relacionados à diáspora africana. A TD aconteceu no dia 21 de novembro de 2014 na FLIDAM em São João de Meriti, RJ.












Bienal do livro em Minas Gerais
O livro foi lançado no dia 23 de novembro de 2014 em Minas Gerais na Bienal do livro. A experiência de troca com profissionais da educação, alunos, cidadãos e leitores foi de muita espontaneidade. Os leitores se sentiam atraídos por uma leitura com proposta “diferenciada e inovadora”, diziam os leitores. Foi um sucesso.










segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Aída Batista e as divas negras do canto lírico no Brasil


Cantora lírica internacional, brasileira nascida em Nilópolis, RJ, 1961.  Dona de uma raríssima voz de tom de soprano. Mulher negra e pobre cantava desde pequena na rua em cima das goiabeiras, varrendo a casa, lavando roupa pra fora com sua mãe e aos finais de semana, no coral da igreja batista da cidade. Ela afirmava “não saber fazer nada sem cantar”.
A vida de Aida está cheia de semelhança com a vida de Mahallia Jackson, Sarah Valghn, Alberta Hunter, Bessie Smith, Aretha Franklin e dezenas de outras cantoras negras americanas que começaram a carreira cantando em igrejas e com o gospel chegaram ao Jazz, ao Blues e ganharam o mundo.
Para sobreviver no dia a dia enquanto estudava música e línguas ela cantava em clubes, chás beneficentes, casamentos e outras recepções para ganhar um cachê a mais. Sempre expressou seu orgulho em ser negra e sua paixão por Zezé Mota, Pelé, Benedita da Silva, Maguila e Paulinho da Viola.
Aos 13 anos de idade fez um teste para pianista com capitão João Dias, quando descobriu que ele, até aquela data, havia sido o único negro a pisar no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Então ela sentiu o que teria que enfrentar pela frente.
Em agosto de 1988 ano do centenário da abolição da escravatura, ela foi a segunda colocada no segundo Concurso Nacional de Canto Lírico em São Paulo e a vencedora do concurso Jovens Concertistas da Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro. 
Andou de avião pela primeira vez no dia 10 de dezembro de 1988, quando foi a Brasília realizar um recital de canto no Conjunto Cultural da Caixa Econômica Federal, foi também a primeira vez que se hospedou em hotel de luxo.
Certa vez ela declarou ao Jornal Correio Brasiliense: “Quando eu subo no palco as pessoas dizem aquela escurinha ali canta bem” Quando sobe uma cantora branca todos a chamam pelo nome.  Eu sei do exemplo de Maria d’ Aparecida, uma cantora lírica brasileira que não suportou o preconceito no Brasil e se mudou para Paris onde até hoje tem o seu talento reconhecido.  Aqui “eu sei que jamais vou poder interpretar determinadas operas por causa da minha cor.”
Em 1999 Aída é vítima de discriminação racial no prédio 92 da Rua Senador Vergueiro no Flamengo, onde estudava Francês com uma professora particular. O porteiro a impediu de usar o elevador social e quando ela perguntou se o elevador estava com defeito ele debochou da condição dela ser negra. Registrou queixa crime com base no artigo 11 da lei Kaó e expressou o quanto se sentiu pisada, humilhada e preocupada com todos os brasileiros que passam por este tipo de discriminação.  Na ocasião uma TV Alemã que estava produzindo um documentário da vida dela acompanhou a cantora
Radicada na Áustria, veio ao Brasil em 1999 para interpretar um dos principais papéis na montagem de “O escravo”, de Carlos Gomes, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Aída tem como precursora no canto lírico mulheres que também marcaram a música sacra no Brasil e que radicaram em outro país para seguirem sua carreira, fugindo do preconceito acirrado no Brasil.



 Joaquina Lapinha, a primeira cantora lírica brasileira que virou celebridade, e sobre quem pouca coisa se sabe. O sucesso de suas apresentações a levou a fazer uma longa e bem-sucedida temporada na Europa. Mesmo assim, até hoje não foram descobertos retratos que mostrem suas feições. Só existem citações de seu nome em documentos da época, principalmente programas teatrais, partituras e críticas musicais. Sua origem é tão misteriosa quanto sua morte. O pouco que se sabe dela é que, por ser negra, teve que vencer diversos entraves sociais para que pudesse deleitar as plateias cariocas e lusitanas.
Já havia mulheres cantando no Rio de Janeiro e em Minas Gerais pelo menos desde 1770. Nesse ano, João de Souza Lisboa, proprietário da casa da ópera de Vila Rica – atual Teatro Municipal de Ouro Preto (MG) –, chegou a comunicar ao governador da capitania de Minas Gerais que já tinha “na casa da ópera duas fêmeas que representam, e uma delas com todo o primor, muito melhor que as do Rio de Janeiro”. Diferentemente do que ocorria no Velho Mundo, eram comuns no Brasil, até o início do século XIX, atores negros e mulatos, maquiados com tinta branca e vermelha, representando os europeus daquela época. Cantar ópera por aqui, naquele tempo, não envolvia o glamour dos cantores de hoje. Esse tipo de trabalho, muito pelo contrário, era feito por subalternos, e seu descumprimento poderia ser severamente punido. Em casos extremos, a punição podia ser até a prisão.
Foi nesse contexto que surgiu Lapinha, cujo nome verdadeiro era Joaquina Maria da Conceição Lapa e que começou a atuar e cantar em óperas no Rio de Janeiro na década de 1780. Manuscritos que vêm sendo estudados em Portugal, principalmente pelo musicólogo inglês David Cranmer, demonstram que ela trabalhou em várias peças dos italianos Giovanni Paisiello (1740-1816) e Domenico Cimarosa (1749-1801), os compositores mais conhecidos do gênero em seu tempo. De Paisiello, ela cantou, entre outras, “O Barbeiro de Sevilha” – cujo enredo também foi musicado por Gioacchino Rossini (1792-1868) anos depois. Lapinha se apresentou ainda em algumas óperas do italiano Fortunato Mazziotti (1782-1855), do lusitano Marcos Portugal (1762-1830) e do brasileiro José Maurício Nunes Garcia (1767-1830), que lhe dedicou papéis líricos em “Ulisséia” e em “O Triunfo da América”, representadas no Rio de Janeiro em 1809.
O viajante sueco Carl Ruders (1761-1837), responsável por essa informação, também comenta que a cantora era obrigada a disfarçar a cor de sua pele – que os europeus julgavam “inconveniente” – com tinta branca: “Joaquina Lapinha é natural do Brasil e filha de uma mulata, por cujo motivo tem a pele bastante escura. Este inconveniente, porém, remedeia-se com cosméticos. Fora disso, tem uma figura imponente, boa voz e muito sentimento dramático”.
Os documentos até agora localizados sobre Lapinha indicam que, depois de seu começo de carreira no Rio de Janeiro, a cantora se apresentou em várias cidades de Portugal entre 1791 e 1805.
Depois de passar esse período em Portugal, enfrentando as dificuldades decorrentes da sua condição de mulher negra, a cantora retornou ao Rio de Janeiro e continuou cantando óperas. Seu nome parou de aparecer nos anúncios de espetáculos de música lírica em meados de 1813.




Zaíra de Oliveira foi a primeira cantora negra de destaque no País.
Carioca, nascida em 1891, teve formação clássica, tendo cursado canto lírico no Instituto Nacional de Música, atual Escola Nacional de Música. Mas também cantou música popular.
Em dezembro de 1921 participou de um concurso realizado na escola de música. O prêmio seria uma viagem à Europa. Recebendo o primeiro lugar, por ser negra, não lhe foi permitido ir. Era uma época em que ainda não existia a lei Afonso Arinos.
Em 1924 gravou seu primeiro disco, dois foxtrotes: "Tudo à la garçonne", de Pedro Sá Pereira e "La monteria", de J. Guerrero.
Em 1925 participou de festivais artísticos, dos quais o do Teatro Municipal de Niterói, onde cantou "Tosca", de Puccini, "Berceuse", de Alberto Nepomuceno e "Schiavo", de Carlos Gomes, além de "A despedida" e "Cantiga praiana", de Eduardo Souto, com letras de Bastos Tigre e Vicente Carvalho, respectivamente.
Apresentou-se também no Cassino Copacabana Palace ao lado de Catulo da Paixão Cearense e Gastão Formenti. Nesse ano gravou a marcha "Quando me lembro" (de Eduardo Souto e João da Praia), em dueto com o cantor Bahiano, que fez sucesso. Seu maior sucesso, porém, foi a marcha carnavalesca "Dondoca" (de Freitinhas), em 1927, ao lado de J. Gomes Filho.
No início da década de 30, passou a se apresentar na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, acompanhada pelo regional de Canhoto. Em 1932 casou-se com o violonista e compositor Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) e tiveram uma filha, Lígia.

Zaíra cantou ainda em vários coros de igrejas. Em seu livro "Não acuso nem me perdôo", o embaixador Paschoal Carlos Magno considerava-a uma das maiores cantoras negras do mundo.  Faleceu em 1952.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Fernando Diniz um gênio da arte plástica, dopado pelo preconceito!


 “O que melhora o atendimento é o contato afetivo de uma pessoa com outra. O que cura é a alegria, o que cura é a falta de preconceito.”
Nise da Silveira

Fernando Diniz nasceu na Bahia, em 1918. Veio morar com a mãe em casarões de cômodos para baixa renda, no Rio de Janeiro, aos quatro anos de idade. Negro e pobre, nunca conheceu o pai. Sempre acompanhava a mãe, costureira, em casas de família de classe média. Desenvolveu paixão romântica pela filha de uma das clientes que morava em Copacabana e se chamava Violeta. Desde garoto sonhava ser engenheiro.  Estudou em Escola pública e teve boas notas, mais era sempre discriminado pelas crianças brancas.  Quando mais velho, pintou um quadro onde crianças brancas e negras brincam juntas e sobre o quadro ele falou: “ Isso é bonito, mais só é real na imaginação”. 
Ouviu na Escola por diversas vezes que o preto não podia ocupar os primeiros lugares menos ainda ser engenheiro.  Chegou ao primeiro ano científico, mas abandonou os estudos na adolescência. E passa andar descuidado de sua aparência e higiene pessoal.
Em 1944, foi preso e levado para o Manicômio Judiciário, por estar nadando despido na praia de Copacabana, seu único ato de rebeldia. Em 1949, foi transferido para o Centro Psiquiátrico Nacional, em Engenho de Dentro, onde conheceu a Dra. Nise da Silveira. Depois de receber sessões de eletrochoque e comas insulínicos, que nada resolveram, foi levado ao ateliê de pintura. Fernando sai do enclausuramento e começa a pintar com avidez, incentivado pelo tratamento alternativo empregado experimentalmente pela Dra. Nise da Silveira, de substituir as terapias agressivas da época por trabalhos artísticos. Com a ajuda dela, Fernando foi incentivado a criar livremente, dando expressão aos seus estados mentais.
Já doente, após uma cirurgia nos rins, foi transferido para a Vila da Unidade Docente Assistencial de Psiquiatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe), em 1997, onde permaneceu produzindo até o seu falecimento em 1999.
Em suas obras mistura o figurativo e o abstrato, em complexas estruturas de composições. O resultado é uma sucessão de imagens, superpostas, dinâmicas e coloridas.
Em 1986, o cineasta Leon Hirzman produz o documentário "Imagens do Inconsciente" que mostra o processo criativo de produção de Fernando.
O encontro entre a psiquiatra Nise da Silveira e o cineasta Leon Hirszman está marcado pela não dissociação de política, sociedade e arte. O trabalho terapêutico e de reabilitação psicossocial desenvolvido por Nise da Silveira tem como característica o estabelecimento de importantes conexões com o campo das artes, possibilitando o diálogo com toda a sociedade. Esse trabalho de transformação cultural e de mentalidades fez com que fosse questionada a exclusão social dos chamados doentes mentais e transformada a política de assistência no campo da saúde mental no Brasil.

A exposição Fernando Diniz - Traços do Inconsciente, reúne trabalhos inéditos feitos por ele.  A mostra conta com diversas composições em cor, com as formas geométricas já consagradas de Fernando. Ele era um dos artistas mais emblemáticos descoberto pelas mostras do Museu do Inconsciente. O reconhecimento de suas obras veio através de exposições no Brasil e no exterior, publicações, filmes e vídeos que permanecem até os dias de hoje.
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