Continuamos a conversa sobre o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil para ordenar a capacidade de gestão das organizações sociais.
Veja a primeira parte dessa discussão: Gestão Sustentável | parte 1
Gestão nas organizações do Terceiro Setor: prioridade para a Sustentabilidade
Outra questão que encontro constantemente nas organizações é a preocupação em elaborar projetos para o desenvolvimento de programas específicos – construir um muro ou reformar o espaço, adquirir instrumentos musicais ou carteiras para os alunos, por exemplo.
A grande maioria se esquece, porém, que podemos elaborar projetos para outras finalidades – projetos para captar recursos de pessoas para garantir a operacionalização da organização (pagamentos de funcionários, água, luz, etc), projetos para captar recursos destinados ao desenvolvimento institucional e o que considero o mais importante – projetos para garantir a sustentabilidade institucional e organizacional a longo prazo. Este, de acordo com os meus levantamentos, o que mais buscam os gestores e onde menos se aplica.
Ou seja, para cada fonte, destinação e projetos específicos. Simples assim, mas complicado de se colocar em prática pois poucas organizações do Terceiro Setor adotam práticas de planejamento e ferramentas de gestão.
Sei que a grita das médias – e principalmente as pequenas organizações da sociedade vai ser grande quando o Marco Regulatório for aprovado e colocado em prática, mas se faz necessário a criação de mecanismos de controle que propiciem mais transparência e credibilidade a utilização de recursos públicos – e tenho certeza de que, com o tempo, os financiadores privados adotarão as mesmas regras.
É preciso, desde já, que as organizações comecem a quebrar paradigmas e comecem processos de qualificação de seus gestores e dos profissionais que atuam ou prestam serviços a elas. Hoje temos vários caminhos para isto, podendo as organizações se utilizarem melhor da internet e das mídias sociais, diversificar as suas fontes de financiamento, lembrar e focar no potencial que existe nos doadores individuais – veja artigo no site da ABCR, ter relações mais transparentes, éticas e estáveis com as fontes públicas e implantarem projetos e programas para fortalecer os mecanismos de sustentabilidade como os fundos patrimoniais.
A mobilização de recursos está diretamente ligada à identidade, à significatividade, ao desenvolvimento e à sustentabilidade institucional.
Outros pontos no projeto do Marco Regulatório passam ainda, de forma necessária, pela estruturação de gestão interna das organizações, como a criação de tipos de parcerias específicos a serem celebrados entre as organizações da sociedade civil e o Estado, como o termo de colaboração – destinado às propostas vindas do poder público e o termo de fomento, a ser aplicado em projetos de livre iniciativa das organizações, além da obrigatoriedade de auditoria externa e a chance de atuação em rede.
De acordo com reportagem da Folha de São Paulo, há também pontos não inseridos na proposta além da contextualização geral do projeto. Segundo Andre Degenszajn, secretário-geral do GIFE (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas):
“O foco do projeto de lei está na contratualização, mas não dá conta de tudo. Quase não aborda a comprovação de resultados, por exemplo. Ele tem uma abordagem extremamente formalista, administrativo-burocrática. Precisa ser aprovado, sim, mas não resolve todas as questões.”
A advogada especializada em terceiro setor e membro da Rede Interamericana de Direito das Organizações da Sociedade Civil, Paula Storto, afirma que o projeto de lei é um avanço, mas também defende a continuidade do debate.
“Organizações sociais sérias têm o direito de ser financiadas pelo Estado. O marco legal atende necessidades das organizações, da sociedade civil e da administração pública e traz mais segurança jurídica a essas parcerias, mas poderia ter ido além. Ele facilita as relações com organizações prestadoras de serviço, mas o mesmo não ocorre com ONGs que pensam a participação social, que tentam trazer novas tecnologias sociais, como no passado ocorreu com a Pastoral da Criança e a disseminação do soro caseiro.”
Merula Steagall, presidente da Abrale (Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia) e da Abrasta (Associação Brasileira de Talassemia), vencedora do Prêmio Empreendedor Social 2013, concorda com as ressalvas.
“Mesmo quando temos uma lei, temos pouco poder de assegurar a sua implementação. Pela nossa experiência, hoje é muito difícil qualquer tentativa de parceria séria sair do papel. A burocracia acaba impedindo projetos que possam ser úteis à sociedade.”