Fora do Brasil há mais de 5 meses, longe da família e amigos, e o que mais dá saudade é a… comida. Sim, a comida! Pode parecer insensível no primeiro momento, mas a falta que uma farofa faz na vida de alguém é incrível. E do pão francês crocante com manteiga e um pingado, da tapioca com leite condensado e côco, a coxinha de padaria, o pastel de feira com caldo de cana, e o pão de queijo cadê?! Quando saí por aí à procura da cultura alimentar de outros povos, comecei a compreender muito mais a riqueza de tudo que comemos no Brasil.
Por outro lado, muitas situações foram quase um cafuné na alma, quando nos tornamos parte de outras famílias que abriram suas portas com tanto carinho. Pudemos viver em outras casas aquele clima gostoso de bate papo na cozinha enquanto fazíamos o almoço, sensação que, para mim, é como estar em casa novamente. Fui descobrindo cada vez mais que comemos também sentimentos e situações, comemos pessoas e sorrisos, comemos a tranquilidade de saber que pertencemos a algum lugar, independente de ser no Brasil ou em uma vila distante no interior da Zâmbia.
Outro jeito de matar a saudade é preparar algo brasileiro. Foi difícil de encontrar leite condensado, mas quando saiu um brigadeiro feito à lenha no chão, ao som de gritos de hipopótamos e elefantes… difícil descrever. Primeiro pelo prazer de ver outras pessoas se deliciando e raspando a panela do mesmo jeitinho que você faz em casa, depois por entender naquele momento o significado do termo “cultura alimentar”, que venho tanto buscando nos outros, e percebendo a minha própria cultura alimentar.
Ao longo do caminho, matei algumas saudades que nem imaginava matar. Chegando no vilarejo de Kendwa, na Tanzânia, foi uma surpresa boa saber que aqui a poderosa e indestrutível dupla arroz com feijão também era a preferida do povo, sendo consumida todo santo dia, como no Brasil. Estar na África, em várias situações, é viver o jeito brasileiro e conhecer nossas raízes. É se sentir pequeno em meio a tantas descobertas sobre o que nos faz ser brasileiros, e perceber como a História contada nas escolas deixou de lado quem tanto contribuiu para a originalidade do nosso povo.
Um dia, à beira da fogueira, grandes amigos zambianos contavam sobre a importância da colheita do milho na aldeia, além das práticas específicas daquela época do ano. A parte preferida deles era fazer uma receita deliciosa, juntando a família para debulhar o milho e preparar uma espécie de bolinho de milho fresco que é cozido nas folhas da própria espiga. “Pára tudo, gente! Isso é pamonha!”, foi o que eu disse num misto de surpresa, identificação e alegria. Lembrei de uma amiga no Brasil que uma vez contou sobre a mesma colheita e sobre a mesma receita que também une a sua família, assim todo mundo caiu na gargalhada e chegou a conclusão de os brasileiros são mesmo muito africanos.
Acredito que toda essa saudade não se trata só da comida em si, mas do significado que ela tem em nossas vidas. Somos a comida que comemos o tempo todo e os sentimentos que carregamos com ela, seja celebrando algo, amando alguém, esquecendo um dia ruim no trabalho, sendo paparicada pela sua avó, e por que não, revivendo e valorizando nossas raízes. Pensando bem, acho que estou com saudade da família, dos amigos e de toda a comida que compartilhamos juntos!