A Constituição da República de 1988 trouxe em seu artigo 227 o instituto da profissionalização como direito a ser assegurado com prioridade absoluta ao adolescente. Destaca-se que conforme o artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA considera-se adolescente aquele que tenha entre doze a dezoito anos de idade, e a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT permite o trabalho na condição de aprendiz a partir dos quatorze anos de idade, conforme seu artigo 403.
Esta política, além de preparar adequadamente o usuário às atividades laborais durante a vida adulta, também visa a proteção no ambiente de trabalho para evitar prejuízos em seu desenvolvimento tanto físico quanto psicológico devido ao momento de formação sensível que vive. Para tanto, a Aprendizagem deve obedecer as diretrizes e bases da legislação da educação, e será fiscalizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE.
Observa-se que a inclusão do adolescente no mundo do trabalho não se demonstra como opção ou consequência, mas sim como um dos objetivos do Programa. Sendo assim, as entidades executoras possuem o direito de pleitear a certificação de entidade beneficente de assistência social, decorrido o entendimento conjunto do artigo 18, parágrafo segundo, inciso II, da Lei 12.868/2013, qual alterou a Lei 12.101/2009 que versa sobre o processo de certificação, e a Lei Orgânica da Assistência Social, Lei 8.742/1993, pois também são consideradas entidades de assistência social aquelas que realizam programa de aprendizagem com a finalidade de promover a integração ao trabalho.
A síntese legislativa acima explanada demonstra que o Programa de Aprendizagem deve ser entendido num contexto de múltiplas políticas sociais, pois envolve direitos conexos a integração ao mundo do trabalho relativos a assistência social, as normas de ensino ligadas a educação e, por fim, as leis trabalhistas correlatas ao trabalho. Desta forma, vem a atingir as diretrizes que toda política destinada ao adolescente deve obedecer: transversalidade, integralidade e intersetorialidade.
Evolução Sócio-histórica
O resgate histórico-social da aprendizagem pode ser buscado a partir de 1840, quando surgiram as Casas de Educandos e Artífices, e logo após os Liceus de Artes e Ofícios, quais realizavam assistencialismo às crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, ou seja, o “direito” não era destinado a todos os usuários.
A Aprendizagem – letra maiúscula ao ser tratada como programa – quase como conhecida nos moldes atuais surge juridicamente com a edição da CLT durante a era Vargas, o pai do populismo, mais especificamente no ano de 1943. Nesta época, a relação era estabelecida entre empresas, adolescentes compreendidos entre 12 a 18 anos e o que o hoje se conhece por “sistema S”, que compreende os serviços nacionais de aprendizagem.
Diante a deficiência na cobertura da demanda pelo “sistema S” e tendo a necessidade de adequar aos parâmetros trazidos tanto pela Constituição quanto pelo ECA, surge no ano 2000 a Lei 10.097, que alterou os dispositivos da CLT relativos a aprendizagem.
Nos anos posteriores, vários foram os dispositivos legais criados visando a proteção do adolescente nas atividades laborais, tais como o Decreto 5.598/2005, a Resolução 74/2001 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, e do Ministério do Trabalho e Emprego a Portaria 88/2009 da Secretaria de Inspeção do Trabalho, a Instrução Normativa 97/2012, as Portaria 723/2012 e 1005/2013, e o Catálogo Nacional da Aprendizagem Profissional.
Todas estas dinâmicas legais e sociais, além de promover a inserção no mundo do trabalho e proteger de riscos, vem a complementar a educação, a renda, a experiência e a qualificação profissional através da aquisição de novos valores e atitudes. Além, unindo todos estes benefícios e a partir da nova fonte de renda, o usuário estimulado por possibilidade de novos rumos, pode cofinanciar ou financiar estudos formais quais os pais sozinhos não teriam condições de fornecerem acessos.
Neste panorama, pode-se observar a congruência do Programa de Aprendizagem com o serviço social, uma vez que além de primar pela proteção da adolescência e reflexamente pela infância, afastando dos riscos laborais, também promove a integração formal e sadia ao mundo do trabalho através de seus atendimentos.
Guarda Mirim de Foz do Iguaçu
O projeto Guarda Mirim de Foz do Iguaçu visa a formação técnico-profissional de adolescentes de 14 a 18 anos promovendo a integração ao mundo do trabalho, através da integralidade do atendimento por meio de atividades complementares envolvendo os direitos ao esporte, lazer, cultura, saúde, alimentação, entre outros previstos no artigo 227 da Constituição da República, abrangendo os mais diversos atores sociais, como as empresas parceiras, a família e a escola.
A instituição realiza, conforme o ECA, atendimento em regime de apoio socioeducativo em meio aberto, e de acordo com a Lei Orgânica da Assistência Social esta inserida na Proteção Social Básica prevenindo vulnerabilidades e o risco social através da incremento de potencialidades e aquisições, e fortalecendo os vínculos familiares e comunitários.
Implementar o Programa de Aprendizagem no município de Foz do Iguaçu trata-se de uma tarefa árdua, mas necessária. Lutar contra os altos rendimentos oferecidos pelas atividades ilegais que permeiam a fronteira torna-se uma luta constante diante a busca pela conscientização do adolescente de que há mais a se ganhar do que apenas na questão financeira, como educação, reconhecimento e segurança. Além, as atividades do Programa tendem a manter o usuário afastado de situações de risco e vulnerabilidade, a exemplo do trabalho irregular, tráfico e consumo de drogas, contrabando, entre outros.
Atenta-se que paralelamente a situação fronteiriça, a questão social iguaçuense fora agravada pelo rápido desenvolvimento econômico que acontecera devido a instalação da hidroelétrica de Itaipu Binacional nos anos 70 e a migração de inúmeros trabalhadores para a cidade.
Durante sua existência o projeto teve de se adaptar a dinâmica social, a exemplo da fuga do sistema paramilitar, qual obrigava a participação das crianças e adolescentes diante a vontade dos pais, e tinha uma visão unicamente assistencialista. Destas ações arcaicas migrou-se à adaptação oriundas da Lei 10.097/2000, garantindo todos os direitos trabalhistas e previdenciários aos adolescentes, a partir deste momento o aprendiz ganha um olhar de sujeito de direitos, não somente no âmbito local, mas a nível nacional diante a vontade do povo, tendo em vista que as mudanças originaram-se na Constituição, qual demonstra-se como representante legítima da nação brasileira.
O Papel do Serviço Social
Dentro do projeto o Serviço Social realiza sua inserção através da busca ativa e trabalho com a rede de atendimento através da identificação de situações de vulnerabilidade e risco social como o trabalho infantil. Após o reconhecimento, trabalha-se com a família e com o adolescente, de maneira articulada com o Sistema de Garantia de Direitos, de forma a reconstruir os elos rompidos.
Além disso, o profissional de Serviço Social observa se os direitos trabalhistas e previdenciários estão sendo garantidos e respeitados, como recolhimento do FGTS, férias somente durante o período escolar, se a jornada de trabalho não esta atrapalhando o estudo formal, etc., não isentando a fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego.
Apresentar ao adolescente Pro Programa de Aprendizagem possibilita que comece a traçar sua independência e seu futuro profissional. Todavia, deve-se atentar ao fato de que a permanência no Programa não deve ser algo forçado, respeitando suas escolhas, para que o desenvolvimento ocorra de forma natural e prazerosa.
Analisar o cenário de empregabilidade local, valorando as ações desenvolvidas na localidade, mostra-se como requisito mais do que necessário, pois almeja-se que o aprendiz ao término do contrato seja efetivado na empresa onde exercera suas atividades. Entretanto, caso a identificação de demanda não ocorra da forma correta, o fim estará frustrado, retornado o adolescente a busca solicita por sua colocação profissional.
Deve-se lembrar que a exploração do trabalho trata-se do fato ensejador das diferenças sociais advindas do sistema capitalista. Tem o Assistente Social e/ ou Gestor Social evitar que este papel sejas reproduzido no Programa de Aprendizagem, utilizando para tanto, além da sua base técnica, seu intelectual orgânico, ligando a teoria a prática.