Um dos grandes dilemas da nossa história moderna é o tema da liderança. Quem, como, quando e por que ela acontece. Se é legítima, à força, pela conquista ou domínio. Conquistadores tornam-se, automaticamente, os líderes dos conquistados. Esse processo de dominação é histórico e vem se transformando ao longo do tempo, mas nunca deixa de lado as figuras daqueles que mandam e dos que obedecem.
No mundo, de forma geral, nunca se falou tanto dos modelos de liderança para servir objetivos diversos. Líderes governamentais para prover o estado de direito e a sua população; líderes empresarias para se destacarem no mercado e ganhar mais dinheiro; líderes religiosos para apontar os caminhos da busca pela paz e equilíbrio pessoal; líderes sociais para apoiar na transformação da sociedade.
Os temas dominam a academia, os seminários, cursos e palestras: “Como ser um líder servo”; “Como se tornar uma liderança de serviço”; “Como ser líder mordomo”; “10 passos para se tornar um líder inspirador”; “A receita para se tornar um líder empático”, e por aí vai.
Desde a minha adolescência, havia essa cobrança ao meu redor: “Torne-se um líder! Você deve liderar, influenciar, convencer, comover e conduzir as pessoas”. Esse era um tipo de cobrança sem sentido para mim, porque acontecia o oposto: processos de construção realmente coletivos, em que assumia um papel de facilitador, sempre deram mais frutos que aqueles de nomeação ou dos quais eu era elegido para ser líder.
Hoje em dia, parece-me que “só presta” – como dizem os caipiras, como eu – o modelo de liderança que vem de fora, do exterior, ou das pessoas bem-sucedidas, em sua maioria, financeiramente. Esse movimento atual, de busca pelo modelo certo de liderança, contamina, ao meu ver de forma negativa, os millennials (geração Y, geração internet). Volta a tônica da cobrança pela liderança transvestida no fenômeno do empreendedorismo: todo mundo tem de empreender, tem que ter a sua startup ou uma iniciativa bombástica, revolucionária. Porém os estudos mostram que é um modismo com data marcada, já que ¹ 74% das startups brasileiras fecham antes dos 5 anos¹. Bom, mas esse é o tema para outra crítica, uma vez que aqui ela ilustra o nível de frustração aos quais os millennials que empreendem, ou melhor, lideram as iniciativas inovadoras, são submetidos.
Apoie boas iniciativas ao seu redor
Não há necessidade em ser o idealizador ou o líder delas. Faça seu serviço bem feito, como se fosse seu próprio cliente. Crie relações com as pessoas sem dominá-las ou oprimi-las. Você não precisa ser a estrela ou o dono da bola a todo momento. No palco da vida, cabe mais gente, mas não tem graça se todos estiverem nele, porque não teremos pessoas para aplaudir.
Em momentos de tanta efervescência por liderança, procura-se gente disposta a ser liderada e que, ao assumir essa posição, contribua, construa, ouça e seja ouvida. Não se busca por oprimidos nem subordinados. A palavra de ordem é: abaixo a literatura que, coberta pelo manto da modernidade, torna as pessoas colonizadoras. Existe espaço na vida para ser simplesmente uma peça fundamental no projeto da vida, independente do papel no qual atua, já que não somos nossos cargos e posições, mas ocupamos, momentaneamente, cada uma delas.
¹ https://epocanegocios.globo.com/Empreendedorismo/noticia/2016/07/74-das-startups-brasileiras-fecham-apos-cinco-anos-diz-estudo.html, acessado em 27 de fevereiro de 2018.