Na última quinta-feira à tarde ministrei aula de Yoga em um Centro Comunitário de minha cidade, aula de um projeto para idosos e que acontece gratuitamente para a população. Neste dia específico tive um tempo livre maior, assim, fui visitar uma querida amiga, uma senhora de 91 anos que carinhosamente muitos chamam de D. Tininha ou simplesmente Clô.
D. Tininha tem um problema cardíaco que a faz ter uma vida regrada, também tem dores nos joelhos, muito comum pela idade que apresenta, mas é uma senhora muito serena de cabeça branca e de grande coração. Ela é muito conhecida em minha cidade por ser a senhora que benze crianças com suas folhinhas de plantas. A meninada já sabe, chega lá na casinha dela e pede: “vovozinha, benze eu”, e corre pra pegar as folhinhas de seu pé de hortênsia que fica bem perto da entrada da sala.
Nesta quinta-feira em que fui visitá-la, estava ela tomando seu café da tarde e convidou-me para acompanhá-la. Sua cuidadora tinha acabado de coar um cafezinho no coador de pano, seu bule é um daquele antigo, feito de alumínio, com um bico comprido e alça de madeira; o cheirinho de café sendo coado estava no ar, de dar água na boca.
Eu e D. Tininha ficamos a conversar um tempão, ela contando passagens de sua vida, me passando ensinamentos preciosos, e eu a escutar como tantas outras vezes fizemos. Conversa amena, gostosa, dia ensolarado, cheirinho de café, e aquela sensação prazerosa de saber que é disso que gosto: sentar-me para tomar café despreocupadamente e conversar com gente que tem papo bom, carinho no coração, gente que fica guardada dentro do coração pra sempre, como tão bem descreve o personagem Polônio da peça teatral Hamlet, de Shakespeare:
Os amigos que tenhas, já postos à prova, prende-os na tua alma com grampos de aço; Mas não caleja a mão festejando qualquer galinho implume mal saído do ovo.
É assim que D. Clô e muitos outros amigos estão presos em minha alma, com grampos de aço, que nem o tempo corrói e que nada os farão se soltar. Um dia disse-lhe, quero vir aqui e gravar suas histórias, seus ensinamentos para poder escrever um livro, e ela ri toda contente, aquele contentamento que entende que ela é importante e que é muito querida, assim como o são todos aqueles que fazem a diferença em nossas vidas.
A vida é cheia de amizades sinceras, de gente do bem, de carinhos e sorrisos que nos cativam, de pessoas que nos acolhem quando mais precisamos, de muitas histórias que precisam ser contadas, de gente que doa seu tempo fazendo uma oração com folhinhas de hortênsia e pedindo com amor e fé para aquela criança dormir bem, ter saúde e ser feliz.
E você, quantos amigos tem atados em sua alma com grampos de aço?
[highlight]Veja também: Uma metáfora sobre abrir seu coração[/highlight]