É impressionante a quantidade de pessoas que estão chegando ao consultório com as expressões do título. Em uma época em que vivemos momentos únicos da história da humanidade, com avanços e tecnologias que, supostamente, deveriam facilitar a vida e trazer mais conforto às pessoas, gerando assim prazer e satisfação, a vida está cada vez mais complicada. Nunca se investiu tanto em pesquisa e produção de novos medicamentos. E a população está cada vez mais doente. A produção de alimentos nunca foi tão grande e cada vez mais pessoas passam fome, ou comem mal. As cidades se tornaram armadilhas, onde a violência, o estresse, o trânsito, os serviços e a segurança em geral, são cada vez mais precários.
Pode ser significativo que os grupos que controlam a produção de alimentos no mundo sejam os mesmos que controlam as indústrias farmacêuticas? Disponibilizam alimentos com todos os tipos de agrotóxicos e anabolizantes, que, certamente, irão gerar doenças, mas disponibilizam medicamentos para curá-las. Nunca se produziu tanto material sobre felicidade e bem-estar e nunca se teve tanta gente infeliz. Sobre o amor se escrevem livros e livros e, cada vez mais, as pessoas perdem a capacidade de amar. E de serem amadas. Os instrumentos de comunicação são cada vez mais sofisticados e cada vez as pessoas se comunicam menos ou são comunicações superficiais e o isolamento e a depressão são as campeãs da temporada.
Quando uma pessoa chega ao ponto de procurar um terapeuta e dizer “Eu não sei viver!”, certamente está revelando sua insatisfação e sua incapacidade em estabelecer um equilíbrio entre os diversos aspectos de sua vida. Costumo trabalhar com três aspectos na vida das pessoas: o ser, o ter e o fazer.
Ter
O ter é percebido como uma necessidade mórbida de acumular coisas, comprar equipamentos e objetos da moda, orientadas por um consumismo cruel. As pessoas não se dão conta que trabalham para pagar contas de coisas que não são essenciais à sua vida.
O acumular passou a ser a regra: eu tenho que ter o último modelo de celular, mesmo que não use 90% das funções, o tênis da moda, nem que custe a metade do salário do mês, o carro novo que lançaram ontem, a TV de 50 polegadas, embora o tempo para ver seja cada vez mais escasso e os conteúdos alienante e banalizem a violência, o sexo, as falcatruas e os falsos modelos de construção social e relacionamentos interpessoais. Um apartamento novo, em um comprometimento de quase toda a vida para pagar, coisa que, muitas vezes, a construção não subsiste ao tempo de validade das obras.
Ter casa na praia, ou campo, sem tempo para usufruir. Roupas, perfumes, penduricalhos mil. Tudo é motivo para ter. As pessoas se consomem no ter. O que o acúmulo e o retorno de tudo isso significa? Na maioria das vezes, muito pouco. Quantas vezes, no caso de separações, tenho ouvido as pessoas dizerem: nos preocupamos tanto em ter coisas que esquecemos de viver e de cuidar de nós mesmos! Agora é vender tudo, geralmente por um preço abaixo do valor, para separar e carregar mágoas e ressentimento, pois isso foi o que sobrou.
Fazer
O fazer é a oportunidade do ser humano se realizar como pessoa, produzir alguma coisa que lhe traga satisfação psicológica e recursos para uma vida saudável. Mas aquilo que deveria ser um prazer, está se transformando em um fardo difícil de carregar. As pessoas trocam seu tempo e esforço por qualquer coisa que aparece: “ foi o que deu para arrumar”, dizem. Fazem cursos e mais cursos, de todas as naturezas, são treinados, certificados, mas não conseguem empregos que gostariam ou estes não lhes proporcionam as alegrias almejadas.
Escutar expressões como: “eu quero sumir!” está ficando cada dia mais comum. Agora rebatizaram velhas técnicas com novos nomes e parece que todos precisam de Coaching e Mentoring para lhes ajudar (e olhem que eu trabalho com isso e sei que podem ser ferramentas úteis!). São pessoas que chegam dizendo “Socorro, por favor! Não sei cuidar de mim, do meu trabalho, dos meus relacionamentos, do meu viver.” As pessoas vivem cansadas e enxergam o trabalho com um único objetivo: meio para ganhar dinheiro e comprar coisas. Quando estão de férias ou nos feriados, quase nunca sabem o que fazer, a não ser coisas que as cansem mais. As ocupações são cada vez mais sofisticadas no sentido de robotização, das pessoas e das máquinas. Peter Drucker, o chamado “pai “ da administração moderna e prêmio Nobel, afirmava há alguns anos:
as empresas estão contratando as pessoas pela capacitação técnica e despedindo pela incapacidade humana.
É o êxodo de si mesmo, a negação do humano em detrimento de uma domesticação e um utilitarismo que se esgota em si mesmo. Quando é preciso atitudes humanas, as pessoas se sentem perdidas. Não foram preparadas e, muitas vezes, não quiseram explorar nada além de simples treinamentos nos cursos, em qualquer nível. A medicina desumanizou-se e as máquinas fazem os diagnósticos. Na maioria das vezes os médicos não sabem lidar com as pessoas, seus pacientes. As escolas vivem conflitos sem fim entre alunos, professores e administrativos. Os sistemas escolares, já faz tempo, prejudicam mais as crianças e os adolescentes, embotando-lhes a criatividade e o crescimento pessoal, na tentativa de inculcar conteúdos e processos que estão vencidos e não servem para nada. Como consequência, o fazer é despersonalizado, autômato e massacrante.
Ser
O ser, ah o ser. Que coisa mais antiquada falar disso. Existem dois tipos de qualidade: a qualidade objetiva, aquela que a gente olha e vê que um objeto foi bem feito, é confortável, é visível e todos podem concordar com ela. E a subjetiva, aquela pessoal e interna, que só poucas pessoas podem perceber por detrás dos papéis que perfomatizamos todos os dias. Tem gente que quando está sozinha está em má companhia. Dizem: “quero alguém que me faça feliz!”. Isso não é possível. Ninguém pode fazer o outro feliz, a não ser que exista um projeto pessoal de ser feliz e se desenvolver como pessoa. Uma pessoa pode, no máximo, ajudar na construção do projeto pessoal do outro. Na falta de um projeto pessoal, nada funciona bem.
Os livros de autoajuda, os milhares de cursos com títulos como: “a felicidade só depende de você”, “aprenda a ser feliz”, “abra as asas para você mesmo e seja feliz”, são oferecidos e consumidos avidamente. Quem paga 600 /700 reais, ou mais, por um curso de final de semana para aprender a ser feliz ou não tem a mínima noção de como a vida é ou tem medo de enfrentar a si mesmo. “Eu não sei viver!” Pode ter uma expressão mais triste que essa? “Eu não sei o que fazer comigo mesmo!” E as pessoas não sabem mesmo, estão infelizes, apesar do carro do ano, do celular da moda, do apartamento bem montado. E andam em busca da pílula da felicidade. Como ela não existe, se consolam com drogas, lícitas e ilícitas, bebidas, atividades vazias e consumismo que se esgota em si mesmo.
Os papéis tradicionais de pai, mãe, amigo, companheiro, filho, irmão, perderam o encanto. O diálogo e as conversas olho no olho saíram de moda. Os filhos, que passam o dia longe dos pais, se conectam através de seus smartphones, sem se conectarem com ninguém. Os pais trocam as horas com os filhos pelos happyhour. A convivência familiar é restringida ao mínimo. Vive-se em um mundo sem tangência, em relações descartáveis, em processos de solidão a dois, três ou quatro. A pior solidão é a acompanhada. Daí para a depressão e às neuroses é um passo. Ninguém vai ter uma fórmula para te ensinar viver. Podem te auxiliar, se você, realmente quiser.
Nesse cenário se coloca a proposta das terapias holísticas, em suas inúmeras formas. Buscam colocar diante das pessoas uma nova proposta de vida, da busca do “ser” perdido, de uma vida mais equilibrada e harmonizada. Pode ser investido tempo em serviço voluntário, onde o contato humano, geralmente, faz mais bem a quem pratica do que a quem recebe. É toda uma nova proposta de vida, mas, para isso, é preciso desintoxicar as pessoas de todas essas drogas, costumes e vícios, lixos que foram se acumulando pela vida a fora. A estrada da felicidade não existe, embora muitos queiram vender mapas dela. Ela se constrói e se desdobra a medida que se caminha por ela. Eu quero que você aprenda, mas você tem de querer antes. Nesse aprendizado você é que faz o currículo. Você não sabe o que fazer com você mesmo? Aprenda, antes que surja alguém com um projeto para te vender em partes para transplantes, pois pouco serve para outras coisas.