Palestrei na abertura do Festival ABCR e convidei as mais de 500 pessoas para refletirem sobre sua atuação social. A provocação era mais ou menos essa: como estaremos em 2050? O que estaremos fazendo?
Sugeri algumas hipóteses. Uma delas é a que alguns de nós estarão em casa, descansando de um árduo trabalho, porque a missão da sua organização havia se encerrado. Há estudos que dizem que até 2050 teremos a cura do câncer. Então que alegria é imaginar que todos os captadores de recursos das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) que lidam com o tema estarão… desempregados. Que excelente perspectiva!
Seguindo na provocação: você concorda comigo que vivemos em um setor realmente fantástico? Nosso objetivo é nossa extinção. Enquanto empresas querem mais e mais lucro, governos querem mais e mais poder e impostos, nós, a sociedade civil, basicamente queremos que um dia não precisemos fazer o que fazemos.
Quem lida com a pobreza, o que acontecerá quando – dizem – boa parte do mundo viverá com uma renda básica?
E as organizações que trabalham no contra-turno escolar? Todas extintas, porque estará implementado o período integral para todos os alunos.
Mesmo aquelas OSCs voltadas para defesa de direitos, já imaginou se muitos desses direitos forem políticas públicas implementadas?
Eu já havia escrito sobre 2027 em um artigo mais festivo. E confesso que esse tema, o futuro, tem me atraído cada vez mais.
O fato é que 2050 tem surgido para mim com uma frequência grande, em artigos, estudos e levantamentos variados. E decidi montar uma pequena categorização dos futuros possíveis para as OSCs atuais. Cheguei a 4 tipos, sendo que uma é um não-tipo. Portanto basicamente vejo que existirão 3 e somente 3 tipos de atuação.
Preparado para esse futuro? Veja as possibilidades profissionais possíveis:
OSCs que fecharam as portas porque cumpriram sua missão
Aquelas que alegremente farão uma enorme festa quando a última criança com câncer for curada, o último pobre for encaminhado, o último aluno for matriculado em turno integral.
Para essas OSCs o foco da captação hoje deveria ser: todos juntos até que possamos vencer o Problema X. Essa é a forma mais convincente de atrair apoiadores atualmente, até que não precisemos mais de recursos, porque o problema acabou.
OSCs que se transformam em prestadoras de serviços públicos
Existe uma nova linha surgindo no horizonte, os chamados negócios sociais, os investimentos de impacto e um conjunto amplo de variações, alguns inclusive chamando essa frente de setor 2 e meio, no sentido de dizer que não é exatamente uma OSC nem exatamente uma empresa, e sim algo no meio disso.
Mas o que vale a pena destacar é que em ambos casos – empresas e OSCs – existe uma sociedade civil querendo ser atendida. E em boa parte das situações isso já acontece hoje em dia. É só ver hospitais, museus e tantos outros sistemas, no Brasil denominados de OSs, organizações sociais.
No resto do mundo isso é amplamente utilizado para milhares de casos. OSCs ou empresas, contratadas pelos governos para prestarem serviços. Muitas vezes o cidadão nem sabe que aquele atendimento é feito por uma organização que não é pública. Ela é privada, mas prestando um serviço público. Isso vai de pedágios a escolas, de presídios a creches, de parques a museus.
Muitas OSCs hoje em dia buscam recursos variados, mas estão muito mais habituadas a receberem recursos de um ou mais convênios estatais. Ou seja, já são uma organização que presta serviço, mas não considera isso como um serviço. Em 2050 basicamente tudo isso se chamará negócio social. Ou simplesmente empresas que atendem ao público em geral, financiados por um contrato de prestação de serviços pago pelo governo.
O que os captadores podem fazer hoje em dia nessas organizações? Ajudá-las a serem cada vez mais eficientes nos serviços prestados, pois o que vem pela frente é uma concorrência pela qualidade. Sai o assistencialismo, entra o atendimento digno, como um serviço prestado por uma organização e financiado pelo estado.
No estado de São Paulo é só observar como funcionam as OSCs da saúde e da cultura. Na Europa isso acontece em quase todos os serviços, boa parte das escolas e inclusive em temas ligados à inovação. O mesmo se dará para todos os demais casos de prestação de serviços públicos, em todo o mundo, até 2050.
OSCs que focarão em causas
Tirando os problemas resolvidos e aqueles casos nos quais o processo se transforma em uma prestação de serviço público por um ente privado (seja OSC ou empresa), o que resta? O bom e velho ideal que nos move, a mim e a você. O que nos fez desistir de um trabalho em um banco ou em um governo para nos dedicarmos à causa que nos move.
Não pense que com esse futuro que expus acima não sobra espaço para as OSCs. Ao contrário, ficará mais evidente e focado o trabalho relacionado às causas. E seu mecanismo de financiamento será um só: doações. É o nosso espaço, captador e captadora! É onde nadaremos de braçada, procurando doadores interessados em apoiar nossa causa, porque, dentro do seu cesto de investimentos, uma parte está relacionada a doar.
Em 2050 qualquer pessoa no mundo dedicará uma parte do seu recurso, até aqueles que terão uma renda básica, para doações. Porque o prazer em fazer isso é superior ao gasto em si. O custo benefício é enorme. As OSCs focadas em causas, de LGBT à qualidade na educação, de associação de handball ao coletivo dos indígenas hackers, da Associação dos Moradores da Vila Ré ao Grupo de circo de Tuiutaba.
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Fonte: Captamos, adaptado por Nossa Causa.