Apesar do crescimento econômico, da queda do déficit primário e de um discurso comprometido com os direitos sociais e climáticos, o governo federal não conseguiu garantir avanços significativos na execução orçamentária de áreas essenciais em 2024. É o que mostra o relatório “Orçamento e Direitos: balanço da execução de políticas públicas (2024)”, que será lançado pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) no dia 29 de abril.
O estudo aponta que o espaço fiscal continua sendo limitado pelo Novo Arcabouço Fiscal (NAF), que reprime gastos sociais e impõe cortes mesmo em programas com vinculação constitucional, como saúde e educação. O resultado, segundo o Inesc, é um orçamento desequilibrado, que transfere parte crescente dos recursos para emendas parlamentares e deixa setores estratégicos subfinanciados.
No ano passado, embora o orçamento autorizado tenha sido de R$ 5,78 trilhões, a execução efetiva ficou em R$ 4,98 trilhões, dos quais R$ 1,32 trilhão foi destinado ao refinanciamento da dívida pública. Os recursos para a função educação, por exemplo, aumentaram apenas 3% em termos reais em relação à 2023, alcançando R$ 166,6 bilhões em 2024 — um avanço tímido frente à demanda acumulada e às metas do Plano Nacional de Educação (PNE).
Segundo Cleo Manhas, assessora política do Inesc, as áreas mais impactadas são justamente aquelas que dependem de recursos discricionários: educação, políticas de igualdade racial, para mulheres, povos indígenas e quilombolas, agenda ambiental, e enfrentamento da crise climática. “O que estamos vendo é a contradição entre o discurso de um governo progressista e a prática de uma política fiscal austera. Há esforço de reconstrução, sim, mas falta ambição, vontade política e disputa real por orçamento”, avalia.
Após cinco anos sem avanços na pauta, os anos de 2023 e 2024 registraram a demarcação de 13 terras indígenas e a publicação de 11 portarias declaratórias. Os números representam um avanço em relação à gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, que se posicionou publicamente contra os povos indígenas. Ainda assim, segundo o Inesc, as medidas são insuficientes para assegurar a autonomia e a sobrevivência desses povos, que continuam expostos a graves ameaças, como grilagem, mineração ilegal, contaminação, desmatamento e mudanças climáticas
Sem prioridade
A crise climática também segue como uma pauta negligenciada. O orçamento de R$ 1,9 bilhão previsto pela LOA para o Programa de Gestão de Riscos e Desastres em 2024 — destinado à prevenção, recuperação e resposta a catástrofes — revelou-se flagrantemente insuficiente diante dos eventos extremos ocorridos ao longo do ano. Foram necessários créditos extraordinários no valor de R$ 5 bilhões para ações emergenciais frente às enchentes, secas e queimadas. Ainda assim, quase não houve investimentos em prevenção, reflexo também de falhas na implementação da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil.
De acordo com o Inesc, esse cenário compromete a capacidade do Brasil de liderar a agenda ambiental global às vésperas da COP 30, que será realizada em Belém (PA), em novembro. “Só há recursos depois do desastre. Prevenção exige estratégia, coordenação federativa e orçamento. Não dá para improvisar”, afirma Cleo.
Orçamento cronicamente insuficiente
No campo orçamentário, a agenda ambiental permanece estagnada em níveis historicamente baixos, com execução inferior a R$ 4 bilhões anuais, em valores reais. Tanto em 2023 quanto em 2024, os recursos efetivamente aplicados somaram R$ 3,5 bilhões. Em termos numéricos, esse desempenho pouco difere daquele registrado durante o governo anterior.
Ao longo de cerca de 200 páginas, o relatório apresenta dados detalhados de execução por função, por ação e por programa, e aponta recomendações que incluem a revisão do arcabouço fiscal, maior transparência nas emendas e criação de fontes permanentes para políticas redistributivas.
(Assessoria de Imprensa)