Lélia Gonzalez, Dia do Trabalho, pandemia e desafios atemporais

Redação
28 de abril de 2021
  • Direitos Humanos
  • Mulheres
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Lélia Gonzalez nos ensinou que as datas de 1º de maio e 13 de maio têm tudo a ver. O dia em que se comemoram o Dia do Trabalho deve causar tantas reflexões como aquele destinado à abolição da escravidão no Brasil. Mais de 130 anos depois, a Lei Áurea segue mostrando que foi boa pra todo mundo, menos para a massa trabalhadora negra que continua sendo explorada a todo vapor.

Em “E a trabalhadora negra, cumé que fica?”, Lélia lembra que a grande maioria das pessoas que estão nos setores ou subsetores de menor prestígio ou pior remuneração são mulheres negras – as mesmas que lideram a porcentagem de pessoas sem carteira assinada. 

Alvo da tríplice discriminação, as mulheres negras, cujo papel foi essencial em tempos de escravidão, foram marginalizadas no pós-abolição e continuam protagonizando episódios horrendos de preconceito, discriminação, cárcere privado e violências físicas e simbólicas de toda sorte.

Nem mesmo a pandemia causada pelo novo coronavírus foi capaz de frear os abusos contra as trabalhadoras domésticas no Brasil. 

A primeira vítima da covid-19 ter sido uma trabalhadora doméstica diz muito sobre passado e presente do nosso país. Em março de 2020, a empregadora de Cleonice Gonçalves tinha voltado da Itália, epicentro da pandemia na Europa, e não dispensou a funcionária. A moradora do Lebon (RJ) contaminou Cleonice, periférica, sexagenária e com comorbidades, que não resistiu às complicações da doença. 

Mirtes Renata de Souza Santana também não foi dispensada do seu trabalho. Com a creche fechada devido à pandemia, Mirtes precisou levar o filho Miguel Otávio até o apartamento onde trabalhava para Sari Gaspar Corte Real. Era junho de 2020. Enquanto passeava com o cachorro da empregadora, Miguel ficou com Sari no apartamento. A falta de cuidado com a criança de 5 anos resultou na tragédia que estampou os jornais: Miguel caiu do nono andar de um prédio de luxo em um bairro de Recife e morreu pouco tempo depois de chegar no hospital.

Meses depois, em novembro, a mídia trouxe à tona um caso que escancara o passado escravista brasileiro que insiste em persistir. Madalena Gordiano, 46 anos, foi libertada após (sobre)viver 38 anos na casa da família de Maria das Graças Milagres Rigueira e de Dalton César Milagres Rigueira. Madalena estava em uma situação análoga à escravidão e desde criança trabalhava pesado, sem direito à remuneração ou férias. O enredo – digno de filme de terror – ainda tem outro capítulo: há mais de 10 anos Madalena foi obrigada a se casar com um parente idoso dos Milagres Rigueira. O homem recebia uma generosa pensão, que ficou para o clã explorador. Madalena nunca conviveu com o “marido” e recebia uma porcentagem ínfima do valor dos rendimentos.  

Além de trabalhadoras domésticas, Cleonice, Mirtes e Madalena são negras.

Infelizmente seria possível citar outros inúmeros exemplos de abusos contra mulheres negras e trabalhadoras negras. Com ou sem pandemia. Mas, em resumo, é preciso que não se esqueça que a abolição representou marginalização da população negra e que o dia 1º de maio deve ser um momento de reflexão sobre as desigualdades históricas que marcam as trajetórias dos trabalhadores negros e, sobretudo, das trabalhadoras negras.

De acordo com a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD), atualmente existem mais de 6,4 milhões de trabalhadoras domésticas, sendo sua maioria mulheres (93%) negras (63%) e moradoras da periferia. Ou seja, 133 anos depois, elas continuam sendo a base da pirâmide de uma sociedade aterrada com raízes machistas e patriarcais.

Maíra de Deus Brito

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