O empoderamento feminino, basicamente, se refere a dar poder para outras mulheres e cada mulher assumir seu poder individual. Com isso, há crescimento e fortalecimento do papel de todas na sociedade.
Um processo que tem ainda mais valor porque contribui para diluir a ideia de que nascemos para nos odiar e que devemos nos tratar como rivais. Um exercício de desconstrução de duas vias em que não só uma, como duas ou mais, se beneficiam.
Muito se fala sobre empoderamento hoje em dia mas, como é difícil encontrar uma definição para essa palavra mágica. Por vir do inglês empowerment, minha tradução pessoal seria dar poder, que rima facilmente com enaltecer.
Empoderamento é sim uma palavra muito difícil de tecer um significado exclusivo. É muito mais fácil apontar para suas pontes como representatividade, sororidade e colaboração, soma que resulta no empoderar. Empoderar é enaltecer, botar uma menina ou uma mulher no degrau de cima, contribuir para que conquistem seus espaços, seja de fala ou de trabalho. Não menos importante: enaltecer a si mesma.
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Falando somente de mulher para mulher, essa busca pelo empoderamento começa quando respeitamos umas às outras. É aqui que entra a sororidade, que dissolve a regra patriarcal de que todas nasceram para se odiar, para competirem entre si, especialmente pela atenção masculina. Claro que leva um tempo para chegar à essa conclusão e, até lá, isolamos aquela que achamos não ser boa o bastante. Falamos mal daquela que é bonita demais. Caçoamos da solteirona aos 30, da mãe solteira, da mulher que sofre abuso do marido.
Em palavras e em gestos, houve um tempo em que muitas barraram o empoderamento feminino por causa dessa regra patriarcal que não nos vê como iguais, mas como competidoras ou rivais. Isso muda quando nos desconstruímos do machismo, universo em que somos inseridas sem opção e em que absorvemos todo o discurso negativo sobre a mulher.
Mergulhadas no patriarcado, silenciamos chances de empoderar ao vermos aquela colega de trabalho como uma ameaça. Silenciamos chances de empoderar ao promovermos mais homens que mulheres. Silenciamos chances de empoderar ao acharmos que a culpa é da vítima. Podemos não ver, mas provocamos desigualdades em vários âmbitos até nos abrirmos para a desconstrução.
Diariamente, ou em um passado não tão distante, fechamos as portas para outras mulheres, justamente devido à ideia de ameaça. De vilãs de novela. De inimigas de estado.
De quebra, houve um tempo em que muitas reproduziram discursos machistas – o famoso “saiu de roupa curta é porque pediu”. Tanto nesse caso quanto no de barrar a promoção de uma mulher, não contribuímos para o empoderamento feminino e fazemos com que essa mulher se sinta incapaz. Fazemos com que ela sinta vergonha de si mesma, desista e acredite realmente que merecerá o fracasso ou o abuso. Ou seja, a fazemos descer os degraus.
Por mais que a culpa da opressão ao redor da mulher seja do patriarcado, nós, mulheres, não saímos imunes ao botarmos outra mulher para baixo. Ao fazermos isso, descemos o mesmo degrau junto com ela.
Empoderar é um verbo de ação
Empoderar não é só sobre mulheres, mas sobre todas as minorias. Da mesma forma que o espaço para a mulher é diminuto, nada se compara ao fechar de portas para representantes da comunidade LGBT, por exemplo.
Quando todo mundo resolve se aliar, se juntam forças para que todos subam a sua escada e conquistem ferramentas para fazer o que quiserem, seja apoiar causas, seja abrir oportunidades, seja chamar atenção para injustiças, etc.
Atualmente, e desde sempre, o feminismo é dividido em vários coletivos. Todos visam pautas próximas, como lutar pela igualdade de gênero, que é o core do movimento. Menciono-os porque dá para se aprender bastante com eles, independente de fazer parte ou não. Observá-los, nem que seja de longe, lhe dá a chance de se inspirar e de tomar atitudes para que mais meninas e mulheres sejam empoderadas.
E o que acontece? Meninas e mulheres se tornam mais vocais, se tornam mais cientes dos espaços que podem ocupar, que juntas elas podem trazer mudanças, por menores que sejam. Empoderar não é um verbo exclusivo de ação. É para todas. Afinal, empoderar é aquele toque gentil no ombro de outra mana que avisa: vai lá, você pode tudo, suba esse degrau.
Mas por que empoderamento feminino é tão importante?
Além de tudo que disse, empoderar é um meio para diminuir desigualdades que ainda existem nos campos da política e da economia no que diz respeito às mulheres.
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Em um âmbito geral, o empoderamento feminino contribui para o crescimento econômico, social e político. Hoje, temos uma maioria branca, heterossexual, cisgênero, da família tradicional comandando a vida de várias mulheres. Mulheres que precisam ser belas, recatadas e do lar, e não estar nas ruas conscientizando sobre a cultura do estupro.
Ainda há o pensamento enraizado, principalmente no Brasil, de que política é coisa de homem. Sendo que muitos homens nada sabem o que é ser mulher e o que ela precisa.
Não é à toa que esses homens não empoderam as mulheres. Ao fazerem isso, não só dariam voz à elas, mas autonomia de suas vidas e autoridade para fazer mudanças. E não pode, certo?
Fato é que só entende de mulher quem é mulher, e o mesmo se aplica à comunidade LGBT que também se vê descendo degraus por falta de representatividade – e por falta de representatividade não há empoderamento. Se esses grupos não ganham espaço, as chances de garantir leis justas são pequenas porque quem está no poder não quer beneficiar essa fatia da sociedade. Leis exclusivas são equivalentes a mimos porque todo mundo é igual e/ou porque todas as vidas são importantes.
De acordo com os princípios da ONU sobre empoderamento, a liderança feminina promove igualdade de gênero, oportunidades iguais, garantia de saúde, segurança e liberdade em cenários de violência e pleno controle da vida. O quanto isso pode ser ruim? Nem um pouco. Mulheres unidas são mais fortes.
Empoderar é liberdade. Uma liberdade que o patriarcado não quer. Empoderar é igualdade e a mulher ainda não é vista como igual na sociedade.
De novo, parece que empoderamento feminino é missão exclusiva dos coletivos feministas ou de entidades como a ONU, mas é uma missão diária que qualquer mulher pode abraçar. Não precisa se dizer feminista para empurrar a mana rumo ao próximo degrau, embora o ato de apoiar uma mulher e enaltecê-la seja intrínseco ao feminismo.
Empoderar é retomar poder. Significa que qualquer pessoa, em qualquer lugar, pode ter controle da própria vida, definir metas, adquirir habilidades e agir. Ao tomarmos o poder, nos tornamos nossas próprias ativistas – ao indagar sobre a cultura do estupro, ao atuar contra injustiças que afetam as mulheres, ao parar de classificar a mulher pela roupa ou status de relacionamento. Empoderadas, protegemos umas às outras.
Empoderamento na rotina
Uma vez por mês, encontro um grupo de mulheres para conversar sobre diferentes temas aqui em São Paulo. Não preciso de um papel que me comprove que aquela conversa de certa forma as empoderou. Vejo isso na maneira como passam a ver a realidade delas e como tomam o poder para si.
Voltemos à sororidade, que quer que ajudemos umas as outras, vejamos umas às outras com respeito e gratidão, ações de claro empoderamento. Uma vez que você se desconstrói e vê que outra mulher não é sua inimiga, que ela não está ali para fazer sua vida um inferno, a energia muda. Uma vez que a energia muda, outras absorvem e então começam as mudanças. Todas querem subir degraus e se recusam a descê-los. Todas se tornam heroínas.
Tudo começa em um labirinto, cheio de caminhos intrincados para que cada mulher perceba que empoderar uma à outra não é bobagem. Que se empoderar não é bobagem. É libertação e autoridade de si mesma. É trincar mais o teto de vidro do patriarcado. Uma vez livre, há a inspiração para que outras façam o mesmo. Isso também é empoderamento.
Ao empoderar, há espaço para o “eu também”. Afinal, o patriarcado quer que as mulheres acreditem que estão sozinhas, que não podem se livrar dos homens, que são dependentes. Porém, uma vez que você se dá uma chance e uma chance para outra mulher, você ouve e se empodera. Você ouve e empodera aquela mulher que muito provavelmente está presa à uma realidade que acredita ser única e sua. Que acredita que suas dores e traumas são irrelevantes.
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O patriarcado quer que tratemos umas as outras com discórdia, com olhares de repúdio e de desconfiança. O empoderamento está aí para nos ajudar a ver que mulheres são relevantes, que elas importam, que não estão sozinhas e que tudo que sentem e fazem é relevante. Que somos imparáveis tanto individualmente quanto juntas.
Empoderar é um ato diário. Você não precisa encabeçar algum ministério para ajudar outra mulher. Você pode começar compreendendo que mulheres não são substituíveis e que nenhuma nasceu para ser sua inimiga. Uma vez que se compreende isso, você também compreende que lugar de mulher é onde ela quiser.
Você também pode iniciar conversas que enalteçam meninas e mulheres. Ou mandar aquele bilhetinho empoderador, dizendo a ela que:
- é possível ter uma vida de propósito e ser respeitada pelo seu valor
- é possível tomar suas próprias decisões e fazer suas próprias escolhas
- a única pessoa que pode lhe ditar algo é ela mesma
- você merece e precisa de direitos iguais e oportunidades iguais
- você pode e deve ter acesso à educação e ao trabalho fora de casa
- sua participação social não é só válida como necessária
- você pode e deve cuidar das suas próprias contas, das suas próprias roupas, até mesmo da decisão de ser solteira e de não querer filhos
- você pode fundar um clube do livro para mulheres ou fazer encontros para discutir pautas relevantes (isso é muito, muito, muito legal!)
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Há muito que se pode fazer para ajudar aquela mana a subir os degraus da vida. Ao empoderar uma, o efeito em cadeia se estende. Somos poderosas. Impulsionando positivamente umas as outras iremos longe. Não haverá patriarcado e machismo que resista.
Lembre-se que uma vez que você empodera outra mulher, você se empodera. Você muda o mundo dela e o seu também.
Texto publicado originalmente em 21 de julho de 2016, por Stefanny Lima, atualizado em 24 de setembro pela equipe editorial da Nossa Causa.