Um longo caminho para a tolerância: um dia como muçulmana em Curitiba

Redação
15 de setembro de 2015
  • Geral
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Uma polarização de opiniões e ideologias tem dominado os discursos políticos e da própria sociedade civil. Não se encaixar no meio em que vive pode sim significar problemas, e casos de xenofobia já não são tão raros em nosso país. Poderia contar inúmeras histórias de haitianos, senegaleses e angolanos que são discriminados todos os dias pela sua cor ou sua origem, mas são poucos os que contam as histórias dos muçulmanos no Brasil. A islamofobia não é discutida, mas é sentida, principalmente pelas mulheres.

Segundo dados do instituto norte-americano Pew Forum on Religion & Public Life, quase um quarto da população mundial é de muçulmanos, ou seja, um bilhão e meio de pessoas. No Brasil, de acordo com a Federação Islâmica Brasileira, estima-se que há mais de 1,5 milhão de fiéis. O problema está na falta de conhecimento e nos extremistas religiosos, que ao disseminar o terror e a violência geram o preconceito, o medo e a hostilidade.

um dia como muçulmana 1

Após o atentado à revista francesa Charlie Hebdo, em janeiro de 2015, houve muitos relatos de agressões e atentados contra muçulmanos em cidades de todo o mundo, inclusive no Brasil, como São Paulo, Belo Horizonte e Cuiabá, com episódios de apedrejamento. A islamofobia expandiu suas fronteiras para além da Europa e dos Estados Unidos.

Quando comentei com alguns amigos o que pretendia fazer, ouvi repetidas vezes que dificilmente daria certo, pois no Brasil é diferente. Será que aqueles episódios haviam sido casos isolados? Eu sabia que não. Então, resolvi tirar as pessoas de suas zonas de conforto e colocar a diversidade escancarada aos olhos de todos. Com uma gopro escondida e um niqab – tradicional véu islâmico em que revela apenas os olhos – fomos às ruas.

um dia como muçulmana 2

Era um sábado de sol, auge do verão e tomei de ponto de partida a Mesquita Imam Ali, no centro histórico de Curitiba, por acreditar que nas redondezas, as pessoas encarariam com mais naturalidade uma mulher de véu. Na quadra seguinte, já sentia o peso dos olhares nos carros e nas ruas e o calar das conversas ao me ver passar. Estava considerando toda a atenção muito mais como curiosidade do que preconceito, até virem os primeiros insultos.

“Você é uma idiota, tire isso”

Pensa que está aonde? Volta pro teu país!”

“Cuidado que ela tem uma bomba escondida aí embaixo”

“Você é uma oprimida, aqui somos livres!

um dia como muçulmana 3

um dia como muçulmana 4

Livres. Quem? Ao se valerem de estereótipos, estavam presos em sua própria ignorância. Não enxergar que ali estava uma mulher, um ser humano antes de tudo, brasileira, ou não, que teve seus direitos e principalmente, sua dignidade violada, estas pessoas, que se dizem defensoras da liberdade, foram os principais agentes da opressão. E não parou por aí. Barulhos de bomba, piadinhas e risadas foram a trilha sonora da caminhada. Um sinal da cruz de uma senhora ao me ver passar foi a própria materialização do preconceito.

E aí você pode dizer que isso é atitude de pessoas mais velhas, conservadoras ou com pouca instrução. Mas as principais manifestações vieram de jovens, frequentadores de uma área que recentemente se tornou refúgio à cultura urbana da cidade. Pessoas que teoricamente se consideram abertas à diversidade e ao novo. Teoricamente.

Estas poucas horas de caminhada me fizeram refletir muito. Neste cenário, temos de um lado jovens locais que se sentem ameaçados pelo diferente e vêem nas agressões físicas e verbais como forma de autodefesa e defesa de seu território. De outro lado, jovens que não conseguem se enquadrar dentro da sociedade em que vivem e que normalmente enfrentam privações sociais, levando alguns à atitudes extremas. Temos então, uma reação em cadeia.

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E qual a lição final de tudo isso? Preservar o direito de cada um em sua diversidade, cultura e crença.

Liberdade é, antes de tudo, respeito. 

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