Que o planeta está dando sinais de alerta, a gente já sabe. Que o tempo não corre ao nosso favor, a gente também sabe. Na semana do meio ambiente achei que seria um bom exercício estrear essa coluna conversando sobre o papel da generosidade na pauta climática.
E, aqui, quero usar a generosidade como um termo agregador para representar qualquer tipo de doação, financiamento ou investimento social na área. Essa manifestação pode vir de uma doação pontual de um indivíduo numa campanha emergencial que responda a um desastre climático, por exemplo; pode vir de um financiamento para uma mobilização sem precedentes para manter a Amazônia de Pé; ou outras formas de apoio.
O ponto aqui é que o tamanho da nossa resposta a um dos maiores desafios da humanidade pode ser definido pela forma que iremos nos comportar perante ele. Se a gente olhar para o que vivemos no início da pandemia do Covid-19, os dados mostram que a solidariedade bateu recordes no mundo, a cultura de doação disparou e a generosidade salvou vidas. As causas socioambientais são as questões que mais mobilizam as gerações mais jovens, que além de mais engajadas, são as que mais se preocupam com a crise climática.
Mas não queria aqui colocar o mesmo peso entre diferentes atores. Isso é importante de dizer. A gente sabe que as pessoas individualmente podem fazer muita coisa e a mudança de comportamento tem relevância nesse movimento de uma relação mais sustentável com o mundo. A doação de pessoas físicas podem colaborar (e muito!) com as questões socioambientais, fortalecendo iniciativas da sociedade civil, por exemplo, mas o desafio da crise climática tem uma raiz sistêmica e demanda o envolvimento dos diferentes atores. Precisamos dar o peso devido a quem promove os maiores impactos negativos no meio ambiente, que é o mundo corporativo.
Vivenciamos um boom na pauta ESG, que em inglês significa Environmental, Social, and Corporate Governance, e representa um conjunto de boas práticas a partir dos pilares do meio ambiente, social e governança nas empresas. O momento oferece uma boa oportunidade de parceria entre o setor corporativo e organizações da sociedade civil que estão buscando diversificar fontes, garantir sua sustentabilidade e autonomia financeira. Eu tenho testado alguns caminhos criando produtos direcionados para o setor e a possibilidade de inovar é gigante.
Com isso, queria muito afirmar que a pauta ESG não é um mundo de flores, pelo contrário, tem muita empresa praticando o ESG-washing interessada em atrair investimentos e conquistar consumidores e consumidoras, que, de fato, estão cada vez mais preocupados/as com o propósito dessas marcas. Algumas empresas até inovam em processos e produtos, mas mantém a mesma lógica e modelos de negócios que estão longe de serem sustentáveis.
Mas, também queria dizer que tenho encontrado empresas que estão sim comprometidas com a mudança e com um desejo legítimo de contribuir para um futuro possível. Confesso que no meu radar até agora tenho visto que a grande maioria dessas são pequenas ou médias, mas importante considerar que há um caminho por aí.
No campo das Fundações, Institutos, Agências e Cooperação Internacionais vejo que existe uma diversidade de abordagens. No Brasil, o que anos atrás tinha uma concentração geográfica muito grande (algo que em alguma medida permanece), hoje tem uma movimentação diferente acontecendo. A Filantropia está ainda mais atenta às vozes dos territórios, dando centralidade em suas estratégias a temas como racismo ambiental, segurança e soberania alimentar. E isso não acontece por acaso. As pessoas que estão sendo mais afetadas pelas mudanças climáticas vêm dando o tom de onde esses recursos podem ser aplicados. A última Cúpula dos Povos, a COP26, foi a que teve maior representatividade da história, com presença de indígenas, quilombolas e da juventude.
O meu sentimento é que a história está sendo reescrita exatamente agora. Uma amiga, ambientalista, defensora dos direitos, Áurea Carolina, sempre usa o termo confluência máxima para explicar alguns fenômenos que acontecem quando a gente reúne muita gente. Talvez seja a hora de ativarmos a generosidade como motor de uma confluência máxima que seja capaz (e irá) salvar o mundo.
Texto: Daiane Dultra, mobilizadora de pessoas e recursos, consultora e mentora, estudiosa de inovação e fundraising, gestora no NOSSAS, captadora do Mapa do Acolhimento e da campanha Amazônia de Pé.